Por um mundo melhor

Tudo na vida é uma questão de referência (de ponto de vista), por isso essa noite pensando no que o mundo se transformou, conclui que não cometi um único acerto na minha vida profissional.

O primeiro grande erro foi ter me apaixonado por saúde pública, podia ter sido gerente de banco, os nossos são tão eficientes quanto os melhores do mundo e eu ainda ia trabalhar no ar condicionado.

Podia ser sido governanta, sou organizada, boa dona de casa, era mais fácil e de quebra, não precisava pagar a feira.

De quanta bobagem eu participei… a minha vida profissional foi voltada pra ajudar a solucionar problemas de saúde que acometem as comunidades, pra quê?

Assim que me formei fui trabalhar com crianças desnutridas. Naquela época baixo peso tinha uma prevalência alta e preocupava. Foi quando descobri que para melhorar o peso era preciso cuidar da saúde de forma integral, em cada adoecimento a criança piorava o estado nutricional e voltávamos para o começo.

Daí comecei a me envolver nas campanhas de vacinação, na preparação dos profissionais para administrar soro de reidratação oral, na melhoria das coberturas vacinais de rotina, nas políticas de proteção à criança.

Passei a entender que famílias com muitos filhos era fator de risco e aderi ao trabalho de planejamento familiar, a melhoria do pré natal, as ações de promoção à saúde, me juntei a um monte de sonhadores fazendo as mesmas coisas e isso acabou por ajudar a diminuir a taxa de mortalidade infantil, (aquela que a criança morre antes de completar um ano) e avançar nos indicadores de qualidade de vida.

Esse conjunto de pequenas ações aumentou e melhorou a oferta de serviços no país todo (se for feita uma comparação com anos anteriores e não com o mundo encantado que cada um tem na cabeça), e testemunhei o incremento do acesso da população à saúde, como consequência pudemos comemorar mais tempo de vida.

É aí onde concluo que errei e errei feio, não devia ter feito nada disso. Os meninos que morreram cedo não tiveram que passar pelas dificuldades de um mundo tão violento. Um mundo que a escola pode representar um risco…

Viver mais com menos filhos resultou em idosos que não tem a “solteirona” pra tomar conta deles e que estão fadados ao abandono, sem que haja algo pensado para solucionar esse problema.

Um mundo em que gente como eu é jovem para aposentadoria e velho para encontrar uma ocupação, onde vale tudo pelo dinheiro, que a aparência ē super valorizada, que a mentira não ē um mal.

Quem já morreu, ainda que tenha ido para o inferno, deve está mais confortável que quem permanece por aqui (inclusive porque de calor nós entendemos) que estamos constatando a imensa quantidade de gente que continua a acreditar na superioridade branca e na solução de conflitos pela força armada.

Certamente no inferno a casa não afunda num buraco, não se comemora um incêndio na favela, não se negligência com o lixo de barragens…

A banalização de tudo o que devia ser importante e a valorização da futilidade, o ressurgimento (sem pudor) da homofobia, da misoginia, do racismo e por aí vai, me faz ter certeza que melhor está quem já morreu.

Se a minha vida tivesse findado a alguns anos atrás, eu tinha ido com a CERTEZA que o mundo havia melhorado e que as conquistas civilizatórias estavam asseguradas, não teria assistido o triunfo da mediocridade.

Errei nas minhas escolhas, faço parte do fracasso do mundo em que vivo e me pergunto qual a tragédia que falta acontecer para que haja uma revolução social rumo a um mundo melhor e com mais empatia? Um mundo onde viver seja uma dádiva e não um castigo.

 

 

Fonte: *Katia Betina (*É articulista)

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