Dinheiro gasto pelo MEC com distribuição de tablets poderia construir mil escolas rurais

ROBSON FERNANDJES/AEROBSON FERNANDJES/AE

No início do mês de fevereiro, o ministro da educação, Aloizio Mercadante, anunciou a distribuição de 600 mil tablets para professores do ensino médio. O valor investido será de R$ 150 milhões.

Um levantamento feito pelo R7 concluiu que, com o mesmo montante, seria possível construir cerca de mil escolas rurais ou 217 escolas de educação infantil, que beneficiariam mais de 26 mil crianças. Também daria para manter, anualmente, mais de 20 mil crianças em creches e mais de 50 mil estudantes de ensino médio.

Também seria possível construir 42 escolas de grande porte, que atenderiam mais de 45 mil alunos, ou então equipar mais de 300 bibliotecas escolares e comprar mais de 340 mil kits para equipar laboratórios de ciências.

A comparação dos gastos usa como base os valores de repasse feito pelo FNDE (Fundação Nacional de desenvolvimento pela educação) aos municípios para a construção de novas escolas, e também dados de 2010 do Caqi (Custo Aluno Qualidade Inicial), desenvolvido pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação e apontado pelo MEC como referência para a definição de padrões mínimos de qualidade para a educação pública no país.

Segundo o critério do Caqi, cada aluno tem um custo anual para as secretarias de educação. Esse valor considera o valor dos insumos indispensáveis para o desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem, como bibliotecas, mobiliário e professores.

Cereja sem bolo
Desde o anúncio, especialistas em educação tem discutido a real necessidade desse projeto. Para a maioria, ele não atende as prioridades das escolas públicas do país, que ainda carecem de equipamentos básicos, como computadores conectados a internet.

Na área rural do país, por exemplo, das 70.822 escolas, 838 declararam não ter acesso à água potável, segundo o Censo Escolar de 2010.

Além disso, apenas 13,4% dos alunos do total de escolas rurais têm acesso a um laboratório de ciências e apenas 50% das crianças em fase de alfabetização tem acesso a bibliotecas dentro das escolas.

Segundo o MEC, a distribuição dos tablets começa no segundo semestre deste ano e vai beneficiar escolas que já tem estrutura tecnológica, com computadores e acesso à banda larga.

Para Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, além de não atender a demanda real das escolas, o programa ainda carece de um objetivo que justifique a distribuição dos tablets aos professores.

– É imprescindível verificar se sua distribuição é, de fato, uma prioridade. O recurso investido na compra e distribuição dos tablets poderia ser empregado, por exemplo, em uma importante consulta pública sobre o currículo do ensino médio, que carece de novos rumos. É o equivalente a comprar a cereja, sem ter feito o bolo.

José Marcelino Rezende Pinto, doutor da faculdade de filosofia da USP (Universidade de São Paulo) e especialista em gastos educacionais, diz acreditar que o projeto dos tablets é um grande equívoco.

– Esse material vai ficar trancado nas escolas e só vai fazer a alegria dos fabricantes e daqueles que ganham comissões nas licitações. A prioridade para a área deveria ser equipar as escolas com laboratórios de informática em condições reais de funcionamento, o que não ocorre. Atualmente, esse benefício, quando existe, fica fechado por falta de manutenção ou porque as escolas têm medo dos alunos usarem. Imagine como será com tablets, mais sensíveis que computadores comuns.

Situação como essa já ocorreu no Centro de Ensino 10 da Ceilândia, cidade da periferia de Brasília (DF). A escola foi uma das sete da região a participar do programa UCA (Um Computador por Aluno), do governo federal. No projeto, cada um dos 470 estudantes de ensino fundamental receberia um laptop.

Na prática, porém, o uso aparelho é prejudicado pelo sinal da internet, que é muito fraco e não aceita essa quantidade de computadores conectados ao mesmo tempo. Diante disso, coube a escola optar por um revezamento no uso, o que faz com que a maioria dos aparelhos passe a maior parte do tempo trancada em um laboratório.

Diretrizes
Priscila Cruz, diretora executiva da ONG Todos pela Educação, é mais otimista com relação ao projeto, mas diz acreditar que o plano de ação carece de melhor orientação pedagógica.

– Até o momento, o MEC não estipulou diretrizes para o uso desses tablets. E isso é essencial para que o projeto funcione bem, pois o importante não é o instrumento, mas sim o que o professor vai fazer com ele. E até o momento, não sabemos.

Para ela, o fato de os professores terem acesso a esse material ajudaria a reduzir o receio que a maioria dos docentes tem com relação a tecnologia.

– De fato, há outras prioridades, mas se os professores não foram inseridos na tecnologia nesse momento, será difícil garantir que eles acompanhem os avanços dos alunos.

Fonte: R7

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