Corrupção cresce com a certeza da impunidade

Cientista político avalia momento de crise nacional

ObservatórioalagoanoSaldanha: "Acabar com a corrupção, com o enriquecimento ilícito é algo impossível"

Saldanha: "Acabar com a corrupção, com o enriquecimento ilícito é algo impossível"

O cientista político e professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Alberto Saldanha diz que a corrupção cresce na medida direta da certeza da impunidade e que o fato de a sociedade não fiscalizar os atos dos gestores públicos é um estímulo à quebra das normas da boa conduta administrativa. “Só com uma sociedade mais consciente dos seus direitos e deveres é possível enfrentar a tentação do gestor público em aproveitar as vantagens do cargo em prol de interesse próprio”.

Corrupção, política, cidadania. Para falar sobre esses e outros assuntos, Saldanha concedeu a seguinte entrevista:

Como o senhor vê a possibilidade de melhorias sociais em nosso estado? Em que proporção elas dependem dos governos estadual e municipal?

A dependência das verbas federais é enorme. Sem os recursos do SUS e do Fundef haveria um colapso. Dados da Secretaria do Tesouro Nacional informam que, até agosto de 2004, foram arrecadados em Alagoas R$ 326.679.994 em tributos federais. No mesmo período, o estado recebeu, via transferências constitucionais, recursos que somam mais de 614 milhões, oriundos do FPE – Fundo de Participação dos Estados, do Fundef e da Lei Kandir. Ou seja, Alagoas recebe da União quase o dobro do volume financeiro que recolhe para a Receita Federal. Com a manutenção do atual modelo de política econômica do governo federal, tanto Alagoas como o Brasil continuarão a sofrer com seus históricos problemas sociais.

Uma possível extirpação (ou diminuição) da corrupção em âmbito federal resultaria necessariamente em uma redução do mesmo mal aqui em Alagoas?

É necessário ressaltar o tratamento sério e transparente dado pela Controladoria Geral da União. Sua ação fiscalizadora tem ajudado a combater a impunidade, pois a corrupção cresce na medida direta da certeza da impunidade. Com o auxílio da Justiça Federal e da Polícia Federal, assistimos a uma demonstração do que deve acontecer com aqueles que lesam o erário e os interesses dos cidadãos. Cabe às forças políticas de Alagoas não deixarem dúvidas quanto ao seu interesse em ver tudo esclarecido e, com isso, demonstrarem para os alagoanos e para o povo brasileiro que Alagoas não é só “o paraíso das águas” e que pode se transformar em um símbolo de combate à corrupção.

Onde estão os supostos focos de corrupção em nosso Estado?

O que acontece é que a fragilidade da sociedade civil em exercer seu papel fiscalizador estimula os gestores públicos a estabelecer mecanismos que, sob as mais variadas justificativas, terminam burlando as normas da boa conduta administrativa. Com uma sociedade mais consciente dos seus direitos e deveres, organizada e se fazendo representar nos respectivos conselhos municipais (saúde, educação, entre outros), é possível enfrentar com mais eficiência a tentação do gestor público que se aproveita das vantagens do cargo em prol de interesse próprio. Acabar com a corrupção, com o enriquecimento ilícito é algo impossível, entretanto, a diminuição de sua intensidade dependerá da sensação de impunidade que a sociedade e os poderes públicos permitirem.

Existe diferença histórica entre os políticos alagoanos e dos estados vizinhos?

Nosso modelo concentrador de riqueza e gerador de exclusão social tem imposto “um pensamento único”, não só nas diretrizes econômicas e sociais, mas principalmente, no campo das idéias. Existe muita dificuldade em estabelecer a identidade do que seja “alagoano”. Nossos “grandes vultos” e personalidades são aqueles que deixaram o Estado. A miséria social é tamanha que a elite dominante se dá ao luxo de deixar em segundo plano o debate de idéias. O papel de construtor e reprodutor de valores foi entregue de forma compensatória aos setores das camadas médias. Essas ascendem socialmente dentro das estruturas do Estado, abrigam elementos contestadores, formulam um pensamento crítico, como é o caso da UFAL (Universidade Federal de Alagoas), mas pouco alteram “a vocação alagoana”.

Existiria alguma força em Alagoas que pudesse fazer frente aos grupos políticos locais?

Existe, principalmente entre os setores das camadas médias, parte da intelectualidade e de algumas organizações populares; sem falar na experiência acumulada de erros e acertos dos partidos de esquerda: o desejo da mudança. Mas sem a alteração na rota do país a realidade alagoana não muda. Isso não significa cruzar os braços.

O prefeito Cícero Almeida pode ser considerado como um “populista”? Em que isso é bom ou mau para Alagoas?

Os termos “populismo” e “populista” foram ao longo do tempo se tornando uma espécie de xingamento na tentativa de identificar todo político de má fé, cheio de promessas irrealizáveis feitas na medida para engabelar o povo. Na realidade, o “populismo”, como categoria explicativa, teve a função de responder a uma pergunta inquietante: por que os trabalhadores manifestaram apoio a Getúlio Vargas durante o Estado Novo e quais as razões que os levaram entre 1945 e 1964 a apoiar os líderes trabalhistas e votar no PTB? As respostas estão no programa nacional-estatista, baseado em dois eixos fundamentais: a soberania nacional e a justiça social. Idéias essas reapresentadas e aprovadas com a eleição de Lula em 2002, mas que parece terem sido esquecidas com medo do “deus mercado”. O prefeito de Maceió tenta construir o seu próprio caminho, alia seu carisma à capacidade gestora dos representantes do grupo empresarial que mais o ajudou na campanha. Só o tempo dirá se dará certo.

Fonte: Site Observatórioalagoano.com

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