Enem: Juiz determina que estudante com paralisia cerebral tenha prova reavaliada

Reprodução/Facebookcsm_aW1hZ2Vucy8xNDUyNTUwMzYyZ2Fyb3RvLWx1dGFkb3IuanBn_bd04b4b7a1

Uma decisão judicial pode representar um marco no processo de inclusão de portadores de necessidades especiais no Brasil. O juiz federal Flavio Marcondes Soares Rodrigues, titular da 8ª Vara Federal, em Arapiraca, determinou que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anisio Teixeira – INEP, responsável pela correção das provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), reavalie a prova de redação do estudante Luiz Felipe Alves Pereira, que tirou zero. 

Em sua decisão, o juiz deu um prazo de 30 dias, para que o Instituto corrija a prova considerando as “limitações e singularidades inerentes a uma pessoa portadora de necessidades especiais”, conforme ação ajuizada pela mãe de Luiz Felipe, a jornalista Mônica de Fátima Nunes Alves Pereira. 

A mãe esclareceu que Luiz é portador de Hidrocefalia e Paralisia Cerebral Diplégica Estática – CID 10: G801 e apresenta Deficiência Física, Discalculia, Dislexia e Déficit de Atenção, conforme laudo médico juntado ao processo.

No entendimento do juiz Marcondes, a correção da prova de um portador de tais necessidades requer critérios diferenciados e correspondentes à sua condição. O entendimento está contemplado na Constituição Federal e na Lei nº. 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência). “A atuação contraditória da administração pública, no caso dos autos, revela o quão distante ainda estamos de ver possibilitada a equalização das oportunidades aos cidadãos brasileiros. Sim, porquanto se num primeiro momento foi permitida a inscrição do autor, portador de necessidades especiais [viabilizando a realização das provas sob atenção especial]; num segundo momento, desprezando toda a construção inclusiva que anteriormente se anunciava e havia nutrido esperanças no núcleo familiar do referido aluno especial, a administração pública o julga em igualdade de condições aos demais candidatos, alijando-o do direito fundamental de ser diferente, embora igual aos outros na exata medida de suas necessidades inclusivas. No popular, é como se o Estado ‘tivesse dado com uma mão e retirado com a outra’”, afirma Flavio Marcondes.

O juiz federal também citou o Art. 208, da Constituição: “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”; assim como trabalho doutrinário de sua autoria sobre o princípio da isonomia: “A igualdade como norma, isto é, isonomia em termos normativos, é ditada pela norma, mas ela não é igualdade de fato, porque as pessoas são de fato diferentes”.

Veja outro caso de discriminação:
Deficientes visuais denunciam discriminação em centro educacional

Luta pela garantia de direitos

Para o magistrado, o caso expõe a luta incansável de uma família para fazer valer os direitos fundamentais que a Constituição Federal lhe confere. “Por trás dessa pretensão revelada nos presentes autos, decerto, se escondem anos de superação de limitações físicas, aprendizado de novas posturas, dissabores decorrentes das incompreensões do Estado e da sociedade, solidariedade das pessoas próximas, lutas incansáveis para se tornar visto e sentido pelo corpo social, enfim, uma batalha vivida diariamente com o nobre e único propósito de ser um cidadão como os demais. Não se está pedindo nesta demanda nada além disso! Apenas compreensão das diferenças sob uma ótica inclusiva”, analisa, ao enumerar na decisão, os diversos  comandos constitucionais que tutelam/resguardam o bem estar social dos portadores de necessidades especiais, bem como que impõem uma atuação positiva do Poder Público e da sociedade civil.

Recentemente, atendendo aos ditames do texto constitucional, foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº. 13.146/2015). O artigo 27, inciso XIII, diz: “que é um direito do deficiente o acesso à educação superior e a educação profissional e tecnológica em igualdade de oportunidades e condições com as demais pessoas”, de modo que no momento de avaliação de sua prova escrita deve ser tratado de maneira desigual, adotando o examinador critérios que correspondam sua qualidade de pessoa com deficiência.

Prazo para inscrição no SiSu

Em relação à data para a inscrição no SISU, muito embora seu prazo tenha expirado no dia 14/01/2016, segundo o magistrado, nada impede que o Judiciário profira comando judicial no sentido de garanti-la ao autor, na hipótese de fazer jus, após nova correção de sua redação.

“Por essas razões é que tenho por bem determinar que o INEP realize uma nova correção da redação redigida pelo autor, sendo atendida sua condição especial, não o colocando no mesmo patamar dos demais candidatos que não sofrem das mesmas limitações, possibilitando uma análise conglobante do real sentido da viabilização da participação efetiva de um portador de necessidades especiais em certames dessa natureza, pois só assim serão alcançados os objetivos da política de inclusão social sob os quais nossa República pretende realizar”, diz Flavio Marcondes.

Em sua decisão, o magistrado ressalta que o Poder Judiciário não está interferindo na tarefa da administração pública, uma vez que esse comando judicial não atribui qualquer pontuação ao requerente, apenas determina que a prova escrita do candidato seja corrigida adotando-se critérios diferenciados, como impostos por lei. “Em verdade, é mais uma oportunidade que a administração tem de corrigir sua censurável conduta e reconhecer que errou ao adotar postura diametralmente contrária ao que se espera de um Estado Democrático que vislumbra uma sociedade justa, fraterna e igualitária”, completa o juiz federal.

 

Veja Mais

Deixe um comentário

Vídeos