País mais afetado por Chernobyl está construindo primeiro reator

Getty ImagesO engenheiro-chefe da estação garante que o projeto segue os moldes mais seguros do mundo

O engenheiro-chefe da estação garante que o projeto segue os moldes mais seguros do mundo

Vladimir Gorin estica o braço e aponta para as gruas que, como pássaros gigantes, posam sobre o edifício do reator. As torres de refrigeração se escondem na névoa, mas ainda é possível ver as linhas que desenham as cercas de arame que protegem uma enorme planta nuclear. 

Ele é o engenheiro-chefe da primeira instalação nuclear de Belarus – o Ostrovets. Trinta anos se passaram desde a tragédia de Chernobyl que, ainda que tenha acontecido na Ucrânia, afetou principalmente Belarus, a antiga Bielorrússia. Para ter uma ideia, cerca de 70% da radiação vazada da usina foi parar em Belarus e um quinto da atividade agrícola do país foi contaminado.

De volta para o futuro

“Nossos métodos de design e construção estão entre os mais seguros do mundo”, afirma Gorin. “Estamos orgulhosos de poder ter uma planta nuclear deste tipo em nosso país.” O engenheiro explica, ainda, a espessura da carcaça de aço do reator e as milhares – ou milhões – de toneladas de concreto que estão sendo usadas para construir a nave: Belarus tem apenas 9,5 milhões de habitantes e é um dos países mais planos do planeta. Lá, é possível dirigir durante quilômetros por estradas basicamente desertas, rodeadas de árvores, que se erguem como regimentos de soldados.

Assim como a nave espacial Enterprise, do seriado Jornada nas Estrelas, a sala de controle central do reator é lotada de telas de computadores gigantes e luzes de led piscando, vigiadas por uma falange de especialistas uniformizados.

E, imediatamente, um alarme ruidoso dispara na sala de controle nuclear, ao mesmo tempo em que luzes vermelhas começam a piscar. Os homens uniformizados começam a pressionar botões e se apressam a fazer ligações urgentes. Segurando meu capacete, procuro um lugar para me refugiar. E logo me dou conta de que a estação nuclear só foi construída pela metade e que tudo não passa de um exercício de situação de emergência.

País de contrastes

Belarus é um país sério e surrealista ao mesmo tempo. Tem um ar austero e pesado, mas também é capaz de te seduzir com bom humor e gentileza. E, assim como nos velhos tempos da União Soviética, os que ocupam cargos de autoridade podem ser bem rudes.

Quando fui à ópera e cometi o grave erro de esquecer o número do armário em que guardei o casaco, a mulher responsável me repreendeu por descuido. Mas depois se acalmou e passou a ter pena do estrangeiro esquecido, procurando meu casaco estante por estante. Outra espectadora, uma mulher de Belarus, até ofereceu emprestado o casaco de seu marido. Em outra ocasião, quando meu prato não havia chegado depois de esperar uma hora em um restaurante, perguntei à garçonete e ela foi desdenhosa. Mas, quando recebi o pedido (pouco apetitoso), o chef havia deixado escrita uma mensagem com molho que dizia “peço desculpas”.

A capital de Belarus, Minsk, que se eleva bruscamente sobre a estepe como um cenário, é composta por largas avenidas com blocos de pisos homogêneos. Há estátuas de Lênin por toda parte e grandes praças abertas para desfiles militares. Mas também há muitas igrejas, modernos cafés e lojas de moda.

Sentimentos dúbios

É difícil avaliar como se sentem os habitantes de Belarus – muitos dos quais ainda sofrem de câncer e outros problemas de saúde devido à tragédia de Chernobyl – com relação à nova usina nuclear. Os que criticam o governo dizem que os opositores do projeto são hostilizados ou presos.

Uma mulher que nasceu em um povoado no sul de Belarus, perto de Chernobyl, descreveu uma área perto da sua antiga casa, na zona de exclusão de Chernobyl. Com lágrimas nos olhos, explicou como, devido à contaminação, só permitem que ela vá ao local uma vez por ano para visitar o túmulo de seus parentes. Mas, por um estranho lance do destino, agora ela trabalha perto da nova estação e se mostra otimista. “A princípio parecia estranho morar tão perto da estação nuclear de novo, mas depois pensei ‘esses acidentes não ocorrem duas vezes’ e precisamos de energia”, disse à BBC.

A central nuclear de Belarus fica perto da fronteira com a Lituânia e a apenas 50 km da Vilnius, capital do país báltico. O governo da Lituânia disse que a planta nuclear, projetada e construída por uma empresa estatal russa, representa uma ameaça a sua segurança e que ele descumpriu acordos internacionais. Gorin nega essas acusações: “Somos tão transparentes que convidamos todos para virem aqui”, diz. “Talvez deveríamos lançar um jornal. Seria o The Atomic News (Notícias Atômicas, na tradução livre)”, conclui, rindo.

Fonte: BBC Brasil

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