Blog

Alerta 24 Horas

Todas as postagens são de inteira responsabilidade do blogueiro.

A primeira-dama do samba lembra seu trabalho com Nise da Silveira

ArquivoDona Ivone Lara foi enfermeira e assistente social

Dona Ivone Lara foi enfermeira e assistente social

Nise com um de seus gatos: mestra para Dona Ivone

Nise com um de seus gatos: mestra para Dona Ivone

 

 

Dona Ivone Lara, a Primeira-Dama do Samba, uma das duas grandes matriarcas dos ritmos afro-brasileiros (a outra é Clementina de Jesus), trabalhou com a psiquiatra alagoana Nise da Silveira.

Nesta quinta-feira, 13 de abril, Dona Ivone completa 96 anos de idade, dos quais só os últimos 40 anos foram inteiramente dedicados ao samba. Sim, porque durante os 38 anos anteriores, até se aposentar em 1977, ela não podia se dedicar à carreira artística: trabalhava como enfermeira e assistente social, boa parte desse tempo ao lado da doutora Nise.

Dona Ivone contou essa experiência numa entrevista, em 1999, ao jornalista e crítico musical Tárik de Souza, que a incluiu no recém-lançado MPBambas – Histórias e Memórias da Canção Brasileira, que reúne outras entrevistas históricas.

A conversa de Tárik com a grande dama do samba foi gravada na quadra do Império Serrano, a tradicional escola de samba de Madureira que Dona Ivone ajudou a fundar e onde integrava a ala dos compositores (coisa rara para uma mulher, até hoje) ao lado de lendários bambas como Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira.

A seguir, o trecho da entrevista em que Dona Ivone Lara lembra de seu trabalho com a doutora Nise.

– A senhora fez o curso de enfermagem…

– Fiz o curso de enfermagem, depois o de assistente social. Foi como assistente social que eu me aposentei, depois de 38 anos.

– Trabalhou com a doutora Nise da Silveira.

– Nise da Silveira, trabalhei com ela.

– O que a doutora Nise ensinou para a senhora? O que a senhora aprendeu com ela, que acabou sendo uma pessoa consagrada?

– Ela é consagrada porque foi a criadora da terapêutica ocupacional, o modo de tratar o doente sem levar aqueles choques, sem aqueles tratamentos bruscos.

– Ela foi muito moderna…

– Justamente, ela modificou por completo! Tanto que ela se serviu muito das assistentes sociais, porque ela precisava de muitas informações, não só dos familiares do doente como do próprio doente. Então nós fazíamos o quê? Nós íamos nas casas dos familiares dos doentes para fazer o histórico dos doentes, e por aquele histórico ela idealizava o tratamento, juntamente com os médicos psiquiatras. Quer dizer, o nosso serviço foi muito bom para a doutora Nise e nós aprendemos muito, porque tinha muito doente, por exemplo, que se submetia a choque elétrico, se submetia a outros tratamentos que eram tratamentos bruscos, que muitas vezes, em vez de melhorar, pioravam a situação, compreendeu? E quando acabava o tratamento, ela [doutora Nise] fazia insulinoterapia e com poucas aplicações ele voltava ao normal. Ele se lembrava do que se passou, reconhecia a família, tudo isso. Quer dizer, evitava que o doente passasse por aquelas fases bruscas, o choque elétrico, aquelas coisas todas.

 – Era um trabalho que exigia uma grande dedicação, não é?

– Poxa, uma grande dedicação. Era onde ela precisava do serviço dessas assistentes sociais. Nós fazíamos aquele histórico, não só da família, desde que o doente nasceu. E trazíamos pra ela, pro médico. Mediante o histórico que nós levávamos pra ele, ele fazia o tratamento…

– Fazia o diagnóstico.

– Dali ele tirava o diagnóstico. Ia ver que o doente tinha mais casos na família. O doente apresentava aquele sintoma porque já tinha na família. Às vezes a mãe do doente já era uma doente mental quando gerou o filho. E não se tratava. Quer dizer, só tinha a piorar. E, muitas vezes, ela tinha o filho que nascia com uma causa congênita. E aquilo favorecia o tratamento, às vezes o doente não precisava tomar choque, não precisava de nada disso, era um simples tratamento de algo congênito, que botava o doente bom.

– Mas esse trabalho tomava muito o seu tempo, não é? A senhora tinha tempo de fazer samba?

– Não, só nas horas vagas. Porque quando eu estava no trabalho, era trabalho. Agora, quando eu estava fora do trabalho, em casa, aí não tinha nada de doente. Em casa era o nosso samba, a nossa distração, o nosso lazer era cantar. (…)

 

Veja Mais

Deixe um comentário

Vídeos