As emendas parlamentares foram instituídas ainda no Governo Dilma, em 2015, através da EC n° 86, tornando obrigatória a execução de parte das emendas individuais (impositivas), e para consolidar o poder do Congresso sobre o orçamento, a EC n° 100 em 2019, tornando obrigatória a execução de emendas das bancadas estaduais.
Cada parlamentar pode apresentar até 25 emendas ao orçamento, e são normalmente usadas para atender demandas locais de seus redutos eleitorais.
Usada como poder de barganha em muitas situações, as emendas parlamentares ganharam os holofotes no governo de Jair Bolsonaro quando as emendas RP-9 foram noticiadas pela imprensa, conhecidas pela alcunha de “orçamento secreto” ou “emendas do relator”. A sigla RP-9 vem da classificação contábil da despesa: restos a pagar – tipo 9. São emendas que não possuem transparência na destinação e distribuição dos valores, além de serem incluídas no orçamento da União por iniciativa do relator-geral do Congresso Nacional.
As emendas RP-9 foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal em dezembro de 2022, por violarem os princípios da impessoalidade, moralidade e publicidade da administração pública.
Na prática, o Congresso Nacional sequestra parte do orçamento para fins políticos individuais e favorecimento de seus redutos, invadindo a prerrogativa do Poder Executivo, que é executar o orçamento. A Constituição Federal nunca atribuiu ao Congresso Nacional a tarefa de execução orçamentária, somente a elaboração das leis orçamentárias (LOA, LDO e PPA).
Em 2014, o montante destinado para as emendas era de R$200 milhões. Hoje, este valor supera os R$50 bilhões.

Os R$50 bilhões representam 25% das despesas livres da União. Em outras democracias, o parlamento não pode executar o orçamento, mas tão somente fiscalizar quem foi designado constitucionalmente para executar. É um valor maior do que a verba de 32 dos 38 ministérios do governo federal.
Se as emendas parlamentares são flagrantemente inconstitucionais e consomem uma parcela tão grande do orçamento da União a ponto de prejudicar o superávit fiscal, qual é a justificativa para mantê-las? A resposta é simples: para que os congressistas não barrem toda e qualquer iniciativa do Executivo, tampouco crie o caos político.
As emendas parlamentares tornaram-se um complemento de peso ao fundo partidário, visto que são eles que escolhem a destinação e como usá-los. Como exemplo da destinação irregular, podemos citar o deputado federal Fábio Teruel (MDB-SP) destinou R$2,2 milhões em ‘emendas pix’ para recapear ruas do condomínio de luxo Tamboré I, na região de Alphaville, área conhecida como a ‘Beverly Hills paulista’.
Os valores de mercado dos lotes e casas do condomínio podem variar entre R$6 a R$50 milhões.
Os valores destinados a emendas viraram uma verdadeira farra sem qualquer tipo de fiscalização, pois quem fiscaliza a execução do orçamento é o próprio legislativo — e quando o orçamento é executado pelo legislativo, quem deveria fiscalizar? A resposta é: o legislativo nem deveria estar executando.
Colocar o poder legislativo para executar o orçamento é dizer que o leão pode cuidar da carne. Não há previsão constitucional para essa prática, tampouco órgão fiscalizador. O Tribunal de Contas da União, por exemplo, é um órgão auxiliar do Congresso Nacional — então, quem fiscalizaria a destinação e a transparência das emendas?
Os congressistas, em especial o Presidente da Câmara Hugo Motta, têm dito que o Supremo Tribunal Federal iniciou uma guerra ao suspender o envio das emendas impositivas com destinação discricionária (ou seja, o recurso que o deputado escolhe para onde vai). Mas não foi o Congresso que invadiu a competência do Executivo?
É preciso por um fim na inconstitucionalidade que a imprensa chama de “super poder” do Congresso Nacional, do contrário, iremos ver muitos exemplos como o do deputado Fábio Teruel por aí.
- Acadêmico de Direito (Colaborador)