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Crônicas e Agudas por Walmar Brêda

Walmar Coelho Breda Junior é formado em odontologia pela Ufal, mas também é um observador atento do cotidiano. Em 2015 lançou o livro "Crônicas e Agudas" onde pôde registrar suas impressões sobre o mundo sob um olhar bem-humorado, sagaz e original. No blog do mesmo nome é possível conferir sua verve de escritor e sua visão interessante sobre o cotidiano.

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Malabares

Corpos suados e atléticos esforçam-se para executar complexos movimentos acrobáticos no exíguo tempo de um sinal fechado. Malabares voam girando no ar, assim como bolas, facões e tochas incandescentes. Acrobacias ritmadas de ponta-cabeça no asfalto quente são o resultado de horas e horas de treinos exaustivos para o aprendizado de tais técnicas. E no entanto…
Bem, não me aprofundarei novamente no assunto expondo minha opinião sobre o trabalho de algumas ONGs que ensinam técnicas circenses e Street Dance para crianças e jovens carentes , com o objetivo de tirá-los das ruas e dar-lhes alguma coisa para se ocupar e quem sabe uma perspectiva de futuro, pois recebi algumas críticas à época, de pessoas que acreditam e contemplam a beleza plástica das artes e o caráter lúdico das expressões corporais, quando eu sugeria que seria mais útil se ONGs ensinassem ofícios mais frutíferos, como, por exemplo, assentamento de azulejo, manutenção de piscinas , noções básicas de mecânica , confecção de artesanato , técnicas de pesca ou atendimento ao turista – talvez bem menos divertido para os jovens, mas certamente mais eficaz para colocar comida no prato.
Acontece que percebi que esses jovens que tentam matar seu pequeno felino por dia, estão sofrendo cada vez mais para fazerem disso um meio de sobrevivência. Corpos suados e atléticos esforçam-se para executar complexos movimentos acrobáticos no exíguo tempo de um sinal fechado, mas agora todos os motoristas aproveitam o tal tempo exíguo para ficarem com a cabeça baixa e olhos fixos nos celulares. Sim, sempre eles. Não bastasse a onipresença das atenções dos nossos filhos em casa, os aparelhinhos também estão roubando o parco sustento desses artistas do semáforo. Após a rápida apresentação – que ninguém mais se dá ao trabalho de ver – saem suados e com um sorriso forçado no rosto, na tentativa de parecerem simpáticos e felizes e também para esconderem a máscara da fome e tristeza, mas não encontram um só rosto que assista a sua apresentação fugaz, pois o conteúdo da telinha brilhante rouba impiedosamente a atenção dos motoristas. Cada vez mais raramente uma janela abaixa e uma mão estende-lhes uma moeda. Acho que muito em breve esses elementos da selva urbana acabarão em extinção – coitados. Todavia, não acredito que desaparecerão da face da terra. Quem sabe os encontraremos, um dia, mais bem remunerados assentando azulejos, aspirando piscinas ou consertando nossos carros? Acredito então que serão até pessoas bem mais felizes quando, entre um azulejo e outro, sacarão umas bolinhas do bolso e as farão voar harmonicamente no ar – afinal também acredito na beleza plástica das artes e no caráter lúdico das expressões corporais – mas de preferência de barriga cheia.

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