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Crônicas e Agudas por Walmar Brêda

Walmar Coelho Breda Junior é formado em odontologia pela Ufal, mas também é um observador atento do cotidiano. Em 2015 lançou o livro "Crônicas e Agudas" onde pôde registrar suas impressões sobre o mundo sob um olhar bem-humorado, sagaz e original. No blog do mesmo nome é possível conferir sua verve de escritor e sua visão interessante sobre o cotidiano.

Todas as postagens são de inteira responsabilidade do blogueiro.

Maravilhoso

Entra a jovem paciente na minha sala e eu lhe pergunto:
– Bom dia, tudo bem? Como foi o fim de semana?
– Ah doutor, foi MARAVILHOSO!!! – disse ela, assim mesmo assim em letras maiúsculas.
Ela sentou-se sorridente na cadeira e então fui para perto da minha atendente e disse à ela em voz alta:
– Rose minha filha, estamos agora nós dois aqui morrendo de inveja e de curiosidade para sabermos o que diacho essa menina fez para dizer que o final de semana foi maravilhoso desse jeito.
A menina riu encabulada, mas com a carinha intrigante, querendo provocar um certo mistério:
– Mas foi mesmo, doutor. Não teve nada demais, mas foi maravilhoso!
Então fiz cara de espanto olhando para ela e para a minha atendente e  falei:
– Olha, vou dizer viu? Faz tempo que eu não falo que tive um final de semana MARAVILHOSO. Sabem o que é? Sou bem mais velho e já tive, portanto, vários e vários finais de semanas maravilhosos, então para hoje em dia eu taxar um de “maravilhoso” tem que ser realmente espetacular. Quantos anos você tem mesmo?
– Vinte e um! – ela respondeu.
– Pois é, uma vida inteira ainda a ser vivida. É um livro a ser escrito com muitos finais de semanas à frente para serem considerados maravilhosos.
De repente sou interrompido por minha atendente:
– Por isso não doutor, que eu não tenho 21 anos e  tenho muitos finais de semanas maravilhosos!
Lembro-me então, que ela estava certa. Sua alegria na segunda de manhã era resultado dos seus pândegos finais de semana. Ironicamente, há poucos anos eu  tinha uma outra atendente de quem eu gostava muito. Era uma menina adorável e muito bacana, mas que volta e meia reagia dessa forma ao ser perguntada sobre seu fim de semana na segunda de manhã:
– Bom dia, tudo bem? Como foi o fim de semana?
– Bom dia doutor, não foi bom. Mas, deixe para lá … – respondia num fiozinho de voz.
– O que houve dessa vez, meu Deus? – perguntava compadecido .
– Nada não doutor, já disse, deixe pra lá. Vamos começar que o paciente já chegou!
– Tá bom então. Pode mandar entrar!
– Buááááá!!!! – ela  então previsivelmente caia no choro. As causas eram as de sempre: o marido, o filho, o pai, a vizinha, a inflação, a fome mundial, o aquecimento global…
E assim começávamos as semanas naquelas manhãs de segunda-feira, com aquele clima pesado no ar.
Já com a Rose, minha atendente atual,  conforme ela mesma lembrou, é bem diferente:
– Bom dia, tudo bem? Como foi o fim de semana? – pergunto-lhe gentilmente toda segunda de manhã.
– Ah doutor, foi MARAVILHOSO!!! – diz ela assim mesmo com letras maiúsculas. Aliás, como a paciente do início do texto.
As causas são as de sempre: as praias, as farrinhas, os shows , os paqueras, as amigas… E assim começamos as semanas nas manhãs de segunda-feira.
Qual, portanto, a lição? Nenhuma, ora bolas. Cada um é responsável pelos seus finais de semanas -maravilhosos ou não. A garota por tão pouco classificou seu fim de semana de maravilhoso, a Rose acha praticamente todos maravilhosos; minha antiga atendente quase nunca os tinha e eu, meu Deus, já tive vários e ainda os tenho, mas, sabe como é que é,  a gente vai ficando mais velho, consequentemente mais exigente e portanto mais besta, embora acreditemos exatamente no contrário. Classificar um fim de semana como maravilhoso vai ficando, para mim,  cada vez mais raro – fazer o que? Chega uma hora que tornamo-nos mais rigorosos com os adjetivos, então chamar algo de  maravilhoso, esplêndido ou sensacional é a exceção e não mais a regra. Saudades do encantamento de outrora diante de tão pouco – afinal, quase tudo era novidade.
Faço a menção honrosa à minha querida atendente que mantém-se na superfície da fina camada de gelo, patinando feliz e satisfeita, alheia às intempéries e aos “problemas de sempre”, tendo finais de semana maravilhosos com seus programas banais  e repetitivos, mas capazes de lhe encher de alegria e prazer, bem como também de inveja o seu patrão a cada inicio de semana nas manhãs de segunda-feira.

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