Um amigo meu que adora objetos caros de ostentação, realizou um desejo antigo e comprou um Rolex. O curioso é que ao comprar o caríssimo relógio, o importador que o vendeu entregou-lhe também uma réplica idêntica ao original. Disse-lhe que aquilo era uma prática comum já que existia um certo risco em ostentar no dia...
Um amigo meu que adora objetos caros de ostentação, realizou um desejo antigo e comprou um Rolex. O curioso é que ao comprar o caríssimo relógio, o importador que o vendeu entregou-lhe também uma réplica idêntica ao original. Disse-lhe que aquilo era uma prática comum já que existia um certo risco em ostentar no dia a dia em nosso país, um relógio que custava algumas dezenas de milhares de reais, e orientou-o a usar o legítimo apenas em ocasiões especiais e seguras.
Aquilo me intrigou bastante -a princípio até pareceu-me uma boa ideia, mas depois fiquei pensativo. Não seria melhor ter apenas a réplica, já que esta era mesmo idêntica ao verdadeiro e faria o mesmo efeito pretendido -seja lá qual fosse ele? Mas, depois repensei e percebi que talvez seu ego não suportasse saber que o Rolex que ele carregava no pulso não era original -no entanto, possuir um legítimo escondido no armário de casa, guardado apenas para ocasiões especiais e seguras, deixava-o confortável para ter e usar a tal réplica -como se o legitimasse a usar um redondo “falsiê”. Que louco, não?
Bem, um dia desses tive uma ideia também louca, num dia louco, aliás como ultimamente todos vem sendo. Pensei que adoraria que houvesse uma réplica de mim mesmo, exatamente igual ao original, para que eu a usasse para fazer as coisas menos interessantes, maçantes ou desagradáveis. Mandaria minha réplica pagar contas, discutir e atender gente chata, correr uma hora na esteira, ir a enterros, fazer exame de sangue, ligar para call centers para cancelar assinatura, fazer DRs com a mulher, ir a reuniões de condomínio, interagir em grupos chatos de WhatsApp, enfrentar filas, ir em cartório, voltar a ir à missa, terminar séries e livros que não me motivaram a ir adiante e acabar um monte de coisas inacabadas.
Enquanto minha réplica estivesse lá fazendo as coisas chatas da minha vida, eu estaria fazendo outras coisas mais bacanas e interessantes -ou até mesmo não fazendo nada, de papo para cima. Estaria guardado poupando-me somente para ocasiões especiais, como viagens, boas companhias e ótimos programas.
Minha versão fake trataria de se estressar por mim, de se irritar em meu lugar e me substituir em tudo que me provoca tédio e impaciência.
Pena que não temos essa opção, então somos obrigados a encarar da melhor forma possível, todas as vicissitudes que a vida em sociedade nos obriga.
Todavia, talvez eu não esteja enxergando toda a verdade. Muito provavelmente EU é que seja uma réplica de um outro EU original, que esta hora está num lugar bem melhor, de papo para cima, enquanto eu acabei de correr uma hora na esteira, já já vou pagar um monte de contas e depois vou ter que ligar para um call center para cancelar uma assinatura…