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Corpos de dez mortos em ação da PM são transferidos de cidade

Familiares de vítimas dizem que polícia chegou atirando; Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) afirma que policiais foram recebidos à bala.

Lunae Parracho/Reuters

Corpos das vítimas do massacre em fazenda no Pará são vistos em hospital

Os corpos dos dez agricultores mortos na quarta-feira (24) na fazenda Santa Lúcia, em Pau D’Arco, foram transportados na noite desta quinta-feira (25) para o município de Redenção, no sudeste do Pará, onde serão enterrados. Representantes do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) acompanharam todos os procedimentos realizados nos corpos e as equipes de perícia que foram à fazenda para levantar as informações sobre as circunstâncias das mortes dos agricultores.

Nove homens e uma mulher morreram em um confronto com a polícia na fazenda Santa Lúcia, em Pau d’Arco, na quarta. A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) disse que os policiais foram recebidos à bala quando tentavam cumprir 16 mandados de prisão contra suspeitos do assassinato de um vigilante da fazenda, no fim de abril. As equipes que participaram da operação vão responder a inquéritos policiais militares.

Parentes de vítimas da chacina contestam a versão dos órgãos de segurança do estado de que os policiais reagiram a um ataque dos colonos: segundo os trabalhadores rurais, a polícia chegou na cena do crime atirando.

Segundo os peritos do Instituto Médico Legal, em três corpos havia perfurações a bala na cabeça e nas costas.

O MPPA também reuniu com familiares das pessoas mortas na operação policial. As famílias pediram rigor nas investigações e também que, após a perícia, os corpos retornassem para Redenção. O pedido foi atendido e os corpos saíram no início da noite desta quinta-feira de Marabá e Parauapebas e foram levados para a uma funerária particular, em Redenção.

Área conflituosa
O presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, o Procurador-Geral do Estado e o advogado da Pastoral da Terra estão em Redenção. Eles se reuniram com autoridades e parentes das vítimas e visitaram o local do crime.

Em Belém, a Promotora de Justiça do Ministério Público do Pará, Ione Nakamura, também participou na quinta de uma reunião da comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa). A promotora relatou que a fazenda Santa Lúcia é uma área conflituosa e que existem vários processos de reintegração de posse naquela região.

“Por ser uma região conflituosa, ocorreram alguns crimes que estão sendo apurados pela polícia civil e que culminaram com mandados de prisão preventiva e temporária, além de busca e apreensão. Tudo isso resultou nesse desfecho lamentável que foi a morte desses agricultores”, disse Ione Nakamura, que questionou a retirada dos corpos e armas da sena do crime.

“A cena de crime é de extrema importância para se apurar as responsabilidades e foi citado na reunião que os corpos foram retirados do local e encaminhados para o hospital. Isso vai ser apurado pelos promotores que acompanham a situação”, concluiu a promotora.

De acordo com a Comissão da Pastoral da Terra, só neste ano ocorreram 18 mortes relacionadas ao conflito agrário no Pará. Já no ano todo de 2016, foram 6. O Ministério Público também abriu um inquérito para apurar a causa das mortes.

A fazenda Santa Lúcia é alvo de disputa de terras. O local foi invadido três vezes desde 2015. Em abril o proprietário conseguiu a reintegração de posse, e contratou seguranças para vigiar o local. Segundo o advogado das vítimas, os trabalhadores rurais já haviam informado ao Incra, a ouvidoria agrária e ao Tribunal de Justiça do Pará sobre as tensões na região.

“Eram 200 famílias que ocupavam a área, e a gente vinha alertando as autoridades que estava na iminência de acontecer um novo massacre de Eldorado de Carajás”, disse o advogado José Vargas Júnior.

O Incra informou que não houve acordo financeiro com o dono da fazenda para desapropriar a área para reforma agrária, e que tomou todas as medidas possíveis para regularizar as famílias e evitar conflitos na região.

OAB quer afastamento dos PMs
A Ordem dos Advogados do Brasil do Pará (OAB-Pará) informou que irá pedir o afastamento dos policiais militares que participaram da operação de reintegração de posse. Segundo o órgão, o afastamento dos PMs seria necessário para não haver entraves nas investigações.

O secretário de segurança pública do Pará, Jeannot Jansen, afirmou que as mortes serão apuradas por uma equipe isenta. “Não vamos ser hipócritas e negar a dimensão do episódio. Essa é a razão porque estamos reunidos, porque devemos satisfação para a sociedade, e essa é a razão porque encarregamos a nossa delegacia especializada para ‘tomar conta’ dos inquéritos. Uma equipe imparcial, fora do local que realizará o inquérito”, disse.

Segundo a OAB-Pará, os policiais removeram os corpos do local do crime, o que seria uma conduta irregular e que compromete a perícia e a investigação do caso. Além disso, a Ordem declarou que parentes das vítimas alegam que há pelo menos oito sobreviventes escondidos.

Veja a lista das vítimas
Segundo o Centro de Perícias Científicas Renato Chaves, as vítimas são:
– Antônio Pereira Milhomem
– Bruno Henrique Pereira Gomes
– Hércules Santos de Oliveira
– Jane Júlia de Oliveira
– Nelson Souza Milhomem
– Ozeir Rodrigues da Silva
– Regivaldo Pereira da Silva
– Ronaldo Pereira de Souza
– Weldson Pereira da Silva
– Weclebson Pereira Milhomem

De acordo com a polícia, pelo menos 4 dos 10 mortos no episódio estavam com pedidos de prisão decretados. Os nomes dos mortos que teriam pedido de prisão decretados não foram discriminados.