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Ovo é melhor que política

Fui ao supermercado… desde que Pedro foi estudar fora, essa foi a primeira feira grande que fiz e quando acabei de arrumar tudo em casa, pensei em fotografar a geladeira aberta para “compartilhar” o fato de que ela servia para mais que esfriar o vento.

Daí eu pensei um pouco mais e concluí que possivelmente uma geladeira com ovo, alface, iogurte e outro poucos itens sem nenhum glamour, não iria motivar ninguém a “curtir” a foto como sendo um acontecimento digno de registro.

Tenho experimentado em relação as redes sociais um fenômeno parecido com o que já vivi com a ida ao supermercado, todo dia mudo o que penso.

Quando iniciei minha rotina de fazer feira toda semana, eu detestava ir. Com o passar do tempo comecei a me sentir conformada, depois passei a considerar um prazer, e agora acho indiferente.

Com as redes sociais também aconteceu mais de uma mudança de opinião em cada diferente fase: comecei achando uma maravilha, afinal encontrei gente que não via sempre, passei a me sentir próxima de pessoas queridas, estabelecer novas relações, dividir conquistas e me sentir “incluída”.

Na sequência fui começando a questionar como que o meu almoço, a reunião do trabalho ou os abdominais na academia podiam interessar as pessoas, mas ainda assim seguia “de boa” com a novidade. Depois passei a odiar o ativismo político que invadiu as redes, baseado em mentiras que só servem para reforçar convicções próprias, com chance ZERO de mudar as de alguém.

O que me levou a concluir que nossa índole pouco ou nada mudou com o passar dos séculos, a única alteração significativa que identifico nas conquistas civilizatórias são as leis que servem para ordenar o comportamento, e se ainda temos um monte de Pôncio Pilatos, que na hora de julgar, continuam lavando as mãos para se auto preservarem, seria razoável que cuidássemos de torcer pela justiça e não pela ordem inventada na internet.

Para ser franca, ainda que pareça uma grande bobagem, fiquei tão assustada com o que ia lendo nas publicações de algumas pessoas queridas, que cheguei ao ponto de temer olhar as novidades, com receio de não poder mais considerá-las “queridas”.

Conclui então que “era feliz e não sabia” durante a fase em que as publicações mostravam o cachorrinho, a nova cor do cabelo ou o bolo de aniversário, isso é muito melhor que a falta de empatia que eu identifico.

Por isso resolvi que vou continuar a postar fotos da rotina, piadas, poesias que gosto, todas essas banalidades e ainda que se percam no meio do engajamento dos muitos “digital influencer” da atualidade, vou postar sim, MUITO, numa tentativa inútil de ter menos política e mais futilidades.

Que atire a primeira pedra quem já não buscou no arquivo uma foto antiga, linda, daquele momento inesquecível, para postar “do nada”, apenas para não se sentir excluído da realidade virtual e concluo, melhor assim, muito melhor que as “análises” baseadas na leitura de frases feitas para internet.

E vamos combinar, em se tratando de uma boa self com Photoshop somos imbatíveis, nem Federico Fellini seria tão criativo na edição. Se é pra mentir que seja com leveza.

E mudei de ideia… vou sim postar minha geladeira com ovo e iogurte. Ovo é melhor que política.

Janeiro de 2020