Coronavírus

“Estou indo, mas tenho um pedido. Quero ser cremado”, diz vítima do coronavírus

O piloto de automobilismo César Augusto Visconti, 43 anos, morreu nesta segunda-feira (30) em São Caetano do Sul, no ABC Paulista, vítima do coronavírus. — Foto: Arquivo pessoal

O piloto de automobilismo César Augusto Visconti, 43 anos, morreu nesta segunda-feira (30) em São Caetano do Sul, no ABC Paulista, vítima do coronavírus. Ele foi internado dia 26 de março no Hospital São Luís, na cidade, após passar pelo otorrinolaringologista. César deixa a namorada Fernanda e a filha Yasmim, de 15 anos. Ele faria aniversário nesta sexta-feira (3).

A velocidade da doença surpreendeu amigos e familiares dele, mas ele teve tempo de enviar uma última mensagem para a ex-mulher Luara Vida com um último pedido antes de morrer: ser cremado e ter as cinzas jogadas no Autódromo de Interlagos.

“Luara estou indo pro saco mas tenho um pedido. Quero ser cremado e pede para o Antonio e o pessoal da Escola jogar minhas cinzas no Autódromo de Interlagos, o lugar mais importante de minha vida.”

O pedido feito no leito de morte foi enviado para o amigo Antonio de Souza, da Escola de Pilotagem Interlagos. “Luara, estou indo pro saco mas tenho um pedido. Quero ser cremado e pede para o Antonio e o pessoal da Escola jogar minhas cinzas no Autódromo de Interlagos, o lugar mais importante de minha vida.”

“Foi a ex mulher dele que entrou em contato e passou seu pedido. Eles sempre foram muito amigos e tiveram uma filha”, afirmou Antonio. O corpo de César deve ser cremado dentro de dez dias, segundo o amigo.

Luara disse ao G1 que foram casados por sete anos, e namoraram mais quatro anos. “Ele era muito presente. Apesar de sermos separados, éramos muito amigos. Ele vinha em casa todos os dias. Tive minha segunda filha dia 10 de março e ele acompanhou o parto no hospital.”

Luara afirmou que César começou a se sentir mal dia 16. “Ele começou a ter tosse e febre e parou de vir em casa. Dia 20 ele foi ao otorrino, que o medicou e falou para ficar em casa. No fim de semana ele passou a sentir dor no peito e voltou ao otorrino, que mandou ele ir ao hospital emergencialmente.”

Ela contou que César ligou e disse para que ela cuidasse da filha Yasmim. “Ele sempre foi muito brincalhão. Ele falou que estava indo pro saco e eu falei para ele parar de falar isso. Me fez prometer que cuidaria da nossa filha e que era para eu alugar um carro e jogar as cinzas do corpo dele no autódromo. Eu falei para ele parar de falar isso e mudamos de assunto.”

Luara disse que César ainda estava com celular no hospital quando ligou para ela avisando que seria entubado. “No dia 26 ele piorou e ligou para nos avisar que seria entubado, mas que voltaria três dias depois e que ficaria esse tempo sem entrar em contato e que era para nós não ficarmos preocupados. Foi a última ligação dele.”

O resultado do teste para coronavírus deu positivo. O atestado de óbito consta coronavírus e pneumonia como causas da morte. “Ele era saudável, não fumava, não bebia, era atleta. Ele estava ótimo, feliz. O coração dele era espetacular. Ele era um ótimo pai.”

Luara explicou que o corpo de César saiu do hospital em caixão lacrado e foi levado para o crematório da Vila Alpina. “Tinha muito corpo pra ser cremado, então, nos falaram que era para rezarmos por ele a partir da tarde desta quarta-feira (1º), quando provavelmente seria feita a cremação, que não podemos acompanhar. As cinzas poderão ser retiradas dez dias depois.”

Paixão pelo automobilismo

Antonio disse ao G1 que César era uma pessoa muito querida pelo pessoal da escola de pilotos. “Não é brincadeira o que estamos passando e precisamos nos resguardar em casa, pois a maioria faz parte de grupo de risco. Estou em casa há três semanas, mas continuo segurando está barra.”

Os amigos entraram em contato com a Federação Paulista de Automobilismo (Fasp) para providenciar a homenagem ao piloto. “Já entrei em contato com a federação e iremos realizar uma cerimôia na primeira prova do Campeonato Paulista de Automobilismo deste ano”, disse Antonio.

Por conta das restrições decorrentes da quarentena do coronavírus, o Autódromo de Interlagos está fechado.

“Ele era um excelente piloto, muito rápido e inteligente. Participou de várias categorias e provas como 500 km e Mil Milhas. Em 2006 e 2007 participou do Campeonato Brasileiro de Marcas na equipe da escola, que tinha como companheiros os pilotos como Nelson Alexandre, Belmiro Jr. e Arthur Bragantini. Ele foi o que subiu no pódio. Ele também correu na equipe do Marcos Paoli na Copa Corsa por dois anos”, disse o amigo.

César além de piloto era instrutor na Escola de Pilotagem Interlagos. “Ele veio fazer o curso quando tinha 20 anos e nunca mais saiu do nosso grupo. Era um dos melhores como instrutor”, disse Antonio.

Casos de coronavírus

Subiu para 164 o número de mortes pelo novo coronavírus no estado de São Paulo, segundo balanço da Secretaria Estadual de Saúde divulgado nesta quarta-feira (1º). Com 28 mortes registradas entre terça (31) e quarta (1), o estado tem recorde de mortes desde o início da pandemia.O estado possui ainda 2.981 casos confirmados.

O novo número de casos representa um aumento de 27% em relação aos 2.339 casos anunciados na terça (31). No caso das mortes, o crescimento foi de 21%.

Nesta quarta-feira o número de municípios com mortes pela doença subiu para 16. As cidades de São Sebastião, no Litoral Norte; Suzano, do Alto Tietê, e Cotia, na Grande São Paulo, registraram seu primeiro óbito.

Mortos por coronavírus na cidade de SP — Foto: TV Globo/reprodução

O Instituto Adolfo Lutz conseguiu processar e liberar apenas 0,4% dos testes recebidos para atestar se o paciente estava com coronavírus, na semana passada. Na primeira semana de março, quando a demanda era menor, o instituto processou e liberou 83% dos testes. Até o dia 25 de março, foram recebidos mais de 11 mil testes e liberados 1.224 exames.

Das 164 mortes registradas no estado desde o início da pandemia, 20 tinham mais de 90 anos; 50 na faixa de 80-89 anos; 45 entre 70-79; 32 de 60-59 anos. Outros 17 tinham idade equivalente ou inferior a 59 anos, todos com comorbidades que, assim como os idosos, representam grupo mais vulnerável a complicações da COVID-19. O total soma 96 homens e 68 mulheres.

Testes

O Ministério Público de Contas cobrou nesta segunda-feira (30) que o estado de São Paulo não deve testar apenas pacientes com Covid-19 internados em estado grave, a partir de reportagem publicada no G1 que mostra essa orientação da Secretaria da Saúde.

Cerca de 16 mil testes aguardando análise no instituto Adolfo Lutz. A instituição só conseguiu processar e liberar apenas 0,4% dos testes recebidos para atestar se o paciente estava com coronavírus, na semana passada.

Na primeira semana de março, quando a demanda era menor, o instituto processou e liberou 83% dos testes. Até o dia 25 de março, foram recebidos mais de 11 mil testes e liberados 1.224 exames.

De acordo com o secretário de saúde, José Henrique Germann, o estado de São Paulo possui 201 mortes que ainda aguardam resultado do exame para confirmar se a causa foi coronavírus.

“Uma parcela desses 201 óbitos acumulados vai dar positivo. São pessoas que estavam com Covid-19 e que não foram confirmados na época do óbito, vai ser agora”, afirmou o secretário estadual de Saúde, José Henrique Germann.

Notificação apenas em casos graves

Na segunda-feira (23) a Secretaria Estadual da Saúde determinou que as unidades de saúde da rede pública devem registrar no sistema apenas pacientes internados com sintomas graves da doença.

Pessoas com sintomas leves, especialmente aquelas que não sentem falta de ar, não são registradas como casos suspeitos ou confirmados de coronavírus no sistema oficial, tampouco são submetidas ao teste laboratorial. Especialistas afirmam que a nova metodologia de registro pode levar a subnotificação.

Segundo a Diretora do Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE), Helena Sato, a medida é necessária para concentrar esforços nos casos graves.

“Isso não quer dizer que a gente vai ter menos dados, de jeito nenhum. Nós trabalhamos com vigilância epidemiológica. Então, nós tivemos um procedimento muito parecido na época da pandemia que aconteceu dez anos atrás, em relação ao vírus do H1N1. Antes a gente notificava os casos leves, moderados, depois, com o aumento, com o que se considera uma pandemia, a gente foca nos casos graves. Isso de modo nenhum vai alterar nossas ações de vigilância, não altera em nada”, disse Sato em entrevista ao G1.

“É só uma forma de a gente poder acompanhar o que é mais importante nesse momento. Quando começa a ter mais casos, a gente começa a focar nos graves”, completa.

Para Fernanda Campagnucci, diretora executiva da Open Knowledge Brazil e especialista em transparência de dados, a nova orientação mostra que as estatísticas estaduais precisam ser analisadas com cautela, já que não refletem mais o mesmo cenário que era analisado antes.

“É compreensível que haja mudanças no processo de coleta dos dados, porque a gente está aprendendo a lidar com o vírus, e não há testes suficientes. Mas qualquer mudança na metodologia impacta o resultado. Isso precisa ser comunicado, divulgado, para que as análises sejam feitas com base nessa informação importante da nova orientação”, afirma Campagnucci.

Aumento de casos graves

O secretário estadual de saúde, José Henrique German disse na quinta-feira (26) que os casos de pacientes graves internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) após serem infectados pela Covid-19 aumentaram 42% em 24 horas no estado de São Paulo.

“Os pacientes graves internados em UTI são agora 84. Neste último dia houve um acréscimo de 42%. Isso é mais ou menos característico da epidemia, ela tem dias de mais acréscimo e dias de menos acréscimo. Mas ela vem crescendo, o que mostra talvez para nós que as medidas de restrição de mobilidade estão sendo suficientes ou, pelo menos colaborando de forma bastante efetiva, para que a gente tenha 862 casos”, afirmou Germann.

De acordo com ele, esse crescimento de mortos e pacientes graves é característico de uma epidemia. “Nós éramos praticamente 90% dos casos do Brasil e agora nós somos 30% dos casos do Brasil. O que significa que existe uma expansão da epidemia de forma acelerada. Se nós formos olhar o número de óbitos, nós tivemos no Brasil 57 óbitos, infelizmente, e no estado de São Paulo, 48. No estado de São Paulo ontem eu anunciei 40 óbitos, então, tivemos um acréscimo de 20% no número de óbitos”, disse.

Representantes do comitê estadual de combate ao novo coronavírus em São Paulo afirmam que as medidas de restrição de circulação adotadas nas últimas semanas foram eficazes e ajudaram a conter a curva de crescimento de casos confirmados no estado. Segundo Helena Sato, médica que coordena o comitê, “muito provavelmente haveria um número muito maior [de casos] se as nossas famílias não estivessem em casa”.

Em pronunciamento na terça-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro criticou medidas de isolamento adotadas por estados e municípios. Na quarta-feira (25), Bolsonaro discutiu com o governador de São Paulo, João Doria.

Quarentena

O estado de São Paulo adota estratégias de restrição de circulação contra o coronavírus desde 16 de março. A quarentena começou na terça-feira (24) e vai durar 15 dias, até o dia 7 de abril, para os 645 municípios do estado de São Paulo.

A medida obriga o fechamento do comércio e mantém apenas os serviços essenciais, como nas áreas de Saúde e Segurança. Assim, os hospitais, clínicas, farmácias e clínicas odontológicas, públicas ou privadas, terão o funcionamento normal.

As transportadoras, armazéns, serviços de transporte público, serviços de call center, petshops, bancas de jornais, táxis e aplicativos de transporte continuam funcionando com as orientações dos sanitaristas.

Os serviços de Segurança Pública, tanto estadual, quanto municipais, continuam funcionando normalmente. Os bancos e lotéricas também continuam abertos. As indústrias devem continuam operando, já que não têm atendimento ao público em geral.

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