Promotor quer ressarcimento de R$ 418 milhões para estado.
O Ministério Público de São Paulo informou nesta sexta-feira (5) que entrou com uma ação contra supostas irregularidades em contratos de 2001 a 2002 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Referentes a manutenção de trens, eles vigoraram durante cinco anos e existe a suspeita de formação de cartel nas licitações.
O promotor do Ministério Público Marcelo Milani disse na tarde desta sexta (5) que o órgão pede, na Justiça, a anulação dos contratos e uma indenização por dano moral coletivo. No total, o órgão pede o ressarcimento de R$ 418 milhões para o estado. Além disso, o MP quer também a dissolução das 10 empresas envolvidas. Caso isso ocorra, as empresas teriam que fechar e não poderiam mais funcionar no Brasil.
O promotor Otávio Garcia, que também trabalha no caso, explicou o pedido de fechamento. “Se a empresa se constitui para operar fora das leis do mercado, como um cartel, um dos requisitos para ela permanecer constituída, que é o objeto lícito, está ausente. Portanto, a manutenção do registro dessa empresa não é mais possível”, disse.
As empresas presentes na ação do MP são: Siemens, Alstom, Caf (Brasil), Caf (Espanha), TTrans, Bombardier, MGE, Tejofran, Temoinsa, Mitsui e MPE.
Milani explica que a ação é contra 11 empresas, mas o pedido de dissolução se refere a apenas 10 por uma questão de legislação. "A Caf espanhola está na ação, mas não pode ser adstrita a nossa legislação que disciplina a dissolução de uma sociedade. Ela entra na ação para ressarcir o dinheiro que foi indevidamente ganho", diz o promotor.
A Alstom informou que "não foi notificada e reitera o cumprimento à legislação brasileira". O G1 não localizou as assessorias da CAF, da MGE e da Temoinsa. E aguarda o retorno da MPE.
A Siemens disse, em nota, que "proativamente compartilhou com as autoridades os resultados de sua auditoria interna que deram origem às atuais investigações quanto à possível existência de um cartel no setor metro-ferroviário". "A Siemens sempre desejou e apoiou o total esclarecimento deste episódio por meio das investigações conduzidas pelas autoridades públicas."
A Tejofran informou, também em nota, que "não foi notificada da ação, mas, conforme sua postura, coloca à inteira disposição do Ministério Público todos os dados de sua formação de preços e também dos resultados alcançados nos contratos citados." A Bombardier disse que não irá comentar o assunto.
Marcelo Leonardo, advogado da TTrans e do presidente da empresa, nega as acusações e acredita que a ação será rejeitada pela Justiça. “A TTrans nunca participou e não participa de cartel", afirma o advogado. A Mitsui & Co (Brasil) disse, em nota, que não tem conhecimento sobre a ação e não comentará.
A ação tem como base três contratos (S 2000, S3000 e S2100) nos quais, segundo o MP, as empresas criaram acordo não competitivo para elevar os preços. Para Milani, essa ação ainda é o começo. "Estamos tomando a primeira medida no sentido de desbaratar esse cartel. Nesta ação não colocamos os agentes públicos que são objetos de apuração de eventual propina", diz o promotor.
Ele explicou que uma equipe de promotores está na Suíça para analisar a documentação que se refere a atos de agentes públicos envolvidos na investigação. "Num segundo momento, nós vamos incluir com a documentação que vier da Suíça e com eventual notícia de propina também para reaver o dinheiro aos cofres públicos", explica o promotor.
Todas as empresas citadas na ação mantém contratos com o estado, segundo o Ministério Público. "Existe um contrato em vigor hoje de todas as linhas de trem de São Paulo com essas mesmas empresas", disse Milani. O promotor diz que o MP também investiga os contratos atuais.
Para Milani, o governo deveria agir. "O governo do estado pode (mas não fez) declarar a inidoneidade dessas empresas. A nós, elas são inidôneas." O promotor disse que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) garantiu que o esquema continua. "O relatório do Cade é categórico. Esse esquema ainda está em andamento, está em vigor."
O G1 procurou a assessoria do governo do estado e da CPTM e aguarda um retorno.
De acordo com o promotor, há evidências de formação de cartel porque apenas uma proposta foi apresentada em cada licitação desses contratos, que foram assinados entre 2008 e 2010. Milani também pediu a entrega de dez composições que ainda estariam em oficinas à espera de reforma.
A Polícia Federal concluiu esta semana o inquérito do caso do cartel dos trens em São Paulo e encaminhou o caso para a Justiça Federal. No total, 33 pessoas foram indiciadas por: corrupção ativa, corrupção passiva, cartel, crime licitatório, evasão de divisas e lavagem de dinheiro – os crimes podem ser diferentes conforme o indiciado.
As empresas envolvidas teriam, entre 1998 e 2008, durante governos do PSDB, feito um acordo para dividir entre elas contratos de reformas no Metrô e na CPTM.
Entre os indiciados estão executivos que, na época, trabalhavam em empresas multinacionais e também nacionais que, de acordo com a investigação, faziam parte de um esquema que, pelos cálculos do Ministério Público de São Paulo, provocou um rombo de R$ 834 milhões. Também há ex-diretores da CPTM e o atual presidente da companhia.
A PF diz que era um jogo de cartas marcadas. As empresas não só superfaturavam em até 30% o preço das obras e dos trens, como combinavam qual delas faria a proposta vencedora de determinada licitação. Pelo acordo, quem vencia a licitação subcontratava as perdedoras. Para o esquema funcionar, as empresas pagavam propina a servidores públicos. Segundo a PF, lobistas intermediavam os pagamentos.
O esquema foi denunciado pela Siemens. A multinacional alemã fez um acordo com o Comitê Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e, em troca de não ser punida, revelou como funcionava o cartel.