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Relator condena dirigentes do Banco Rural por fraude

Para Barbosa, ex-dirigentes liberaram empréstimos sem analisar garantias.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão, votou na sessão de julgamento desta segunda-feira (3) pela condenação dos ex-dirigentes do Banco Rural Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane por crime de gestão fraudulenta de instituição financeira.

Os quatro foram acusados de não observar as regras previstas pelo Banco Central na concessão de empréstimos para PT e agências de Marcos Valério, apontado como o operador do suposto esquema de compra de votos no Congresso.

Barbosa concluiu seu voto sobre o item 5 da denúncia da Procuradoria Geral da República, que trata do chamado “núcleo financeiro”. Agora, o revisor Ricardo Lewandowski apresentará seu voto e será seguido pelos demais oito ministros seguindo a ordem de antiguidade – do ministro com menos tempo de STF para o mais antigo.

A gestão fraudulenta é prevista na lei de crimes contra o sistema financeiro e pode resultar em prisão de 3 a 12 anos. A dosimetria da pena (cálculo de quanto tempo cada condenado ficará preso) será feita ao final do julgamento.

Segundo a denúncia, o banco repassou R$ 29 milhões às empresas de Marcos Valério e R$ 3 milhões ao PT por meio de empréstimos fictícios.

O objetivo do grupo, conforme a Procuradoria, era financiar o suposto esquema de pagamento a parlamentares da base aliada em troca de apoio na aprovação de projetos de interesse do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Empréstimos ‘simulados’
Ao retomar o voto sobre ex-dirigentes do Banco Rural nesta segunda, Joaquim Barbosa afirmou que os ex-dirigentes do Banco Rural concederam empréstimos “simulados” e utilizaram-se de “mecanismos fraudulentos” para “encobrir” as operações.

“Essas operações foram simuladas. Deste vasto manancial de provas sobressai igualmente nítido que os altos dirigentes, justamente para encobrir as operações, utilizaram-se de mecanismos fraudulentos, como incorreta classificação do risco e desconsideração da manifesta insuficiência financeira dos tomadores do crédito, não observando regras do Banco Central.”

Para o relator, foram verificadas “expressivas discrepâncias” na avaliação das operações relacionadas às agências de Marcos Valério e ao PT, com o objetivo de “omitir” o nível de risco dos empréstimos.

O ministro citou laudo do Banco Central segundo o qual o Banco Rural aprovou operações de crédito mesmo sem comprovação da capacidade de pagamento dos devedores. "As operações de crédito foram autorizadas sem qualquer embasamento técnico", afirmou.

O ministro afirmou que os empréstimos ao PT e a Marcos Valério não foram contabilizados nos registros oficiais do Banco Rural e que a cobrança foi feita somente depois do escândalo. “Somente depois da divulgação do escândalo do mensalão pela imprensa é que os empréstimos foram lançados.”

“Senhores ministros, à luz de todo o acervo probatório que veio à tona, verifica-se que, na realidade, como bem ressalta a acusação, o Banco Rural só cobrou os valores dos empréstimos após o escândalo do mensalão e assim agiu porque os empréstimos não eram para serem pagos. Essa afirmação de que os valores milionários somente foram cobrados após o mensalão foi comprovada pela própria Kátia Rabello", já havia dito relator na quinta.

Outros cinco acusados no processo já foram condenados – João Paulo Cunha, Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Henrique Pizzolato – e um foi absolvido por unanimidade, o ex-ministro Luiz Gushiken.

Versão dos acusados
O ministro afirmou que o crime de gestão fraudulenta foi praticado em concurso de pessoas, por todos os quatro ex-dirigentes do Banco Rural denunciados pelo Ministério Público. Segundo ele, houve divisão de tarefas na concessão dos empréstimos fictícios.

“Com efeito, é preciso lembrar que o crime foi praticado em concurso de pessoas, numa ação orquestrada, […] típica de um grupo criminoso. Pela divisão de tarefas, cabe a cada qual cumprir determinadas funções.”

Segundo a acusação, Kátia Rabello e José Roberto Salgado autorizaram os empréstimos fictícios. Ayanna Tenório teria autorizado renovação de empréstimos e Samarane teria omitido saques feitos em agências do banco.

A defesa de Kátia Rabello negou a concessão de empréstimos fictícios. O advogado de Salgado viu "construção mental" na acusação. A defesa de Samarane disse que todos os saques realizados foram notificados ao Banco Central.

Barbosa rebateu fala da defesa dos réus de que Carlos Godinho, testemunha que denunciou fraudes no Banco Rural, era funcionário de baixo escalão na instituição. "A informação que temos no processo desmente o que foi dito na tribuna (pela defesa dos réus) de que o Carlos Roberto Sanches Godinho era um funcionário mequetrefe. Ele era superintendente do Banco Rural."

Laudos periciais
O relator destacou que o Banco Rural concedeu R$ 10 milhões à empresa Graffiti, de Marcos Valério, sem ter informações suficientes sobre as condição financeiras da agência.

“O Banco Rural não detinha informações econômicas suficientes que ancoravam o empréstimo de R$ 10 milhões e nem para outro empréstimo para a DNA, de R$ 21 milhões. Isto fica evidente em parecer técnico, emitido por analistas", disse.

Joaquim Barbosa leu ainda laudos periciais que indicam que agências de Marcos Valério forneceram informações falsas para tomar empréstimos. Os dados prestados ocultam, de acordo com o laudo, dívidas milionárias das empresas.

“Agrava-se a situação do Banco Rural o fato de haver toda uma análise financeira com base em informações falsas que ele tinha condições de saber que eram inidôneas. O Banco Rural descumpria conscientemente normativos de combate à lavagem de dinheiro do Banco Central”, reiterou o ministro.

Renovação de empréstimos
Outra questão apontava pelo relator foi a renovação de empréstimos concedidos apesar de parecer contrário de analistas da própria instituição financeira.

“Em flagrante descumprimento desses preceitos normativos, os então principais dirigentes do Banco Rural procederam a arrolagem de dívidas com incorporação de encargos. Realizavam estornos relativos a encargos financeiros devidos em virtude de atrasos e mantiveram a mesma classificação de risco [prevista inicialmente no contrato]”, afirmou.

Nota do Banco Rural
O Banco Rural divulgou nova nota nesta segunda afirmando que os empréstimos concedidos pela instituição foram declarados "verdadeiros" por perícia da Polícia Federal. Disse ainda que a renovação de empréstimos não envolveu novo desembolso de dinheiro.

"As acusações contra os quatro executivos do Rural à época dizem respeito exclusivamente a procedimentos bancários que, analisados tecnicamente à luz da legislação vigente na ocasião, foram todos realizados de forma correta."

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