O peso do tempo

Kátia Betina
Kátia Betina

Hoje o Facebook me “lembrou” um acontecimento de um ano atrás e pensei – Caramba!!! Já tem isso tudo? Nem havia me dado conta que passou tanto tempo.

Pensando no tempo que leva um ano para transcorrer, lembrei-me de Pedro, ainda bem pequeno, quando havia a necessidade de repreendê-lo eu nunca usava a palavra “castigo”, preferia colocar ele sentadinho numa cadeira e dizer: – Fique aí para “pensar”.

Usava pouco tempo, 10 ou 15 minutos, nunca mais que isso, sabia que para ele era uma eternidade e voltava perguntado; – Pensou? Dai conversávamos e o problema estava resolvido.

Dez minutos agora parece durar um piscar de olhos, tudo ficou muito rápido depois que ultrapassei os cinquenta anos. O tempo dentro do abraço da uma pessoa amada voa, e um final de semana com os amigos passa depressa.

Já tive horas longas, as noites de febre do Pedro se arrastavam por séculos, à espera dos presentes trazidos pelo Papai Noel demoravam décadas, o fim de semana nunca chegava.

Hoje não, hoje nem bem o ano começa e o supermercado enche as prateleiras de artigos de Natal, a semana inicia e já chega sexta, o sol nasce e se põe muito rápido, não tenho mais tempo para desperdiçar.

Se quiser ser razoável preciso usá-lo a meu favor, e assim acabei por estabelecer uma nova maneira de ser: entre o cinema e a roupa da máquina, o cinema ganha, entre a feira e um encontro de amigos, os amigos ganham. Se o relógio não funciona mais a meu favor, mudei a forma de olhar para ele.

Não cabendo tudo na agenda com o tempo andando tão rápido, foi necessário fazer algumas mudanças na essência; o amor é mais urgente e tem menos cobranças, as tristezas eu sei que passam, os segredos já não ocupam minhas preocupações.

O certo é que essa acelerada que a vida dá quando chega o segundo tempo é para tornar o peso mais leve. Aquilo que não posso carregar, antecipadamente nem me habilito e já não olho para mim mesma com olhar de repreensão. Hoje, se tenho saudade digo; se não gosto deixo pra lá; se quero ir vou e se me sinto triste como um chocolate.

Depois dos cinquenta anos respeito bem a dois mandamentos: não matar e não roubar. Não mato antecipadamente um amor que não corresponde ao script, ou a esperança de um mundo melhor e não roubo o sonho de quem os tem ou o sorriso de ninguém com maldades desnecessárias. Cuido de preservar viva a fé na vida.

Com o passar do tempo o olhar se torna mais generoso, os julgamentos menos severos, as cobranças mais leves e acabo por concluir que essa pressa imposta por ele não ē de todo ruim, afinal, se tira o viço da juventude, trás mais compreensão, se tira a força do corpo, substitui por uma rotina mais gentil.

As rotinas acabam sendo um bom refúgio de quem já vive no ontem, uma forma de acomodar as necessidades nesse tempo que voa e essa minha semana foi diferente, Pedro foi participar de um congresso fora do estado e estou sozinha em casa. Saio, volto e tudo continua no lugar.

Acabou sobrando tempo e não sabendo o que fazer com ele, usei todinho pra sentir saudade ou me orgulhar de ter conseguido, ao longo da jornada que ē criar um filho, participar na transformação daquele menininho que eu colocava sentado para “pensar”, num homem pronto, que sabe pensar.

A compreensão do tempo muda com o passar dos anos, por isso é tão importante cuidar das escolhas. Parte do peso eu já deixei pelos caminhos que percorri e diante da constatação que um ano pode voar, melhor ficar atenta para ter certeza do que quero de fato carregar comigo.

“Pois senão chega a morte ou coisa parecida e nos arrasta moço sem ter visto a vida”

PS- Uma homenagem à Claudinha Mortimer para quem o destino não foi generoso como devia e a levou sem que ela pudesse dispor do segundo tempo.

Novembro 2017

 

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