Massacres em escolas: onde estamos errando?

Durante algum tempo, quando notícias sobre pessoas armadas que entravam atirando em escolas nos Estados Unidos chegavam até nós, havia a falsa crença de que esses ataques não se repetiriam em outros lugares no mundo. Menos ainda no Brasil. Após as tragédias na Escola Estadual Thomazia Montoro, na cidade de São Paulo, e na creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau (SC), todos os sinais de alerta estão mais uma vez acionados.

Um levantamento realizado por Michele Prado, do Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP, contabilizou 22 ataques a escolas entre outubro de 2002 e março de 2023. Metade deles ocorreu nos últimos dois anos. Os números são preocupantes e indicam a necessidade de ações efetivas.

É preciso olhar o problema na perspectiva da segurança pública. É compreensível agora, no olho do furacão, discutir o aumento da pena para esse tipo de crime ou colocar policiais aposentados na porta das escolas, mas soluções como essas podem não ser definitivas no longo prazo. Outro caminho é investir tempo e dinheiro, por exemplo, para que as áreas de inteligência da polícia mapeiem o submundo digital em que esses ataques são estimulados e valorizados, identificando os potenciais agressores antes de os crimes serem cometidos.

Também é necessário avaliar os ataques sob o prisma da saúde mental. Muitas vezes, quem comete esse tipo de atentado dá sinais de que isso pode acontecer. Alguns dos agressores chegam a pedir ajuda, mas nem sempre têm o apoio de que precisam. Sem acompanhamento médico e psicológico adequado, tornam-se vetores da intolerância, da agressividade e da violência. Profissionais da saúde mental teriam condições de antever e mapear os riscos de tragédias desse tipo, caso pessoas com esse perfil potencial estivessem sendo acompanhadas.

Mas esses ataques precisam ser, sobretudo, analisados levando em consideração o modelo que queremos de educação e de sociedade. A escola é, por definição, lugar do convívio pacífico, do respeito à diversidade, da resolução de conflitos, onde crianças e adolescentes são preparados para conviver em sociedade, para enfrentar os desafios da vida adulta e, ao mesmo tempo, para exercer seu direito inalienável de aprender.

É claro que saber Português, Matemática, Ciências, Humanidades é fundamental. Porém, a escola não é apenas um espaço de transmissão de informações. A sala de aula, a quadra, a cantina, os corredores e todo ambiente escolar são lugares de interação social, em que lidar com o outro e com as diferenças é essencial. Por isso, também é papel da escola promover todos os dias o desenvolvimento das competências socioemocionais dos alunos.

Se queremos uma sociedade mais justa, mais solidária e mais democrática, precisamos fazer uma profunda autocrítica. Só assim será possível descobrir onde e por que estamos errando.

A morte de uma criança que estava brincando inocentemente ou de uma professora que somente praticava seu ofício não pode ser em vão. Mais do que viver esse luto, precisamos agir. E, como disse o poeta inglês John Donne, não é hora de perguntar por quem os sinos dobram. Eles dobram por nós.

* é médico psiquiatra e foi professor por mais de 20 anos. É também fundador do Programa Semente, voltado para o desenvolvimento de competências socioemocionais de estudantes e professores.

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