Facções lucram alugando armas a bandidos

Wanderley Preite Sobrinho/iG São PauloPolícia Civil apreendeu arsenal de armas na casa de um cafetão na zona norte de São Paulo na última quarta-feira (4)

Polícia Civil apreendeu arsenal de armas na casa de um cafetão na zona norte de São Paulo na última quarta-feira (4)

As casas e os carros de luxo não combinavam com o perfil de um cafetão que explorava o trabalho sexual de duas migrantes na Praça da Sé, centro de São Paulo. Intrigada com as investigações que já duravam seis meses, a Polícia Civil finalmente encontrou uma pista para a origem desses bens ao prender o suspeito de 38 anos na última quarta-feira: “Encontramos em suas três casas quatro espingardas, três revólveres, quatro pistolas, munição e um colete à prova de balas. Tudo indica que ele alugava armas para outros criminosos”, afirmou o delegado Roberto Afonso da Silva, que conduziu as investigações.

A forma quase acidental de desmontar um esquema de aluguel de arma ainda é a regra no Brasil, embora esse tipo de crime tenha crescido desde que o Estatuto do Desarmamento foi aprovado, em dezembro de 2003. “Antes do Estatuto esse tipo de crime não fazia sentido porque havia muita arma à disposição. Com um número menor em circulação, o valor delas no mercado negro subiu muito”, avalia Bruno Longeani, um dos coordenadores do Instituto Sou da Paz.
O Primeiro Comando da Capital (PCC) foi a primeira organização criminosa a perceber o potencial desse negócio, segundo o procurador de Justiça Márcio Christino. “É um investimento sem risco. A facção aluga a arma por um valor fixo ou recebe um percentual do que é roubado”, explica. “Essa nunca foi a atividade principal do PCC, mas começou a dar certo e virou um nicho replicado por outros grupos.”

De acordo com procurador, um jovem criminoso recorre ao aluguel de arma por não ter dinheiro para comprar sua própria pistola, que custa em média R$ 7 mil no mercado informal. O delegado Silva concorda: “Quem começa no crime não tem dinheiro e nem a facilidade de antes para conseguir arma. Depois do Estatuto, a oferta caiu, o que tornou mais barato alugar de alguém.”
Era justamente esse “mercado” que o traficante Claudionor Cardoso, de 49 anos, explorava no Rio Grande do Sul. O “senhor das armas”, como ficou conhecido, foi preso no final de 2011 pela Polícia Civil gaúcha. Ele alugava até dez armas toda semana por valores que variavam de R$ 100 a R$ 500. “Um fuzil custa R$ 35 mil no mercado negro. O que é mais vantajoso?”, pergunta Silva.

Segundo o delegado, as gangues oferecem armas para todo tipo de crime, embora os grandes roubos justifiquem a locação de armamento pesado, como o fuzil AK-47, de fabricação russa, alugado por um criminoso em Viamão, no Rio Grande do Sul. Em agosto deste ano, a polícia encontrou um arsenal de 72 armas em uma casa no bairro de Interlagos, na zona sul de São Paulo. Os fuzis e escopetas eram alugados para roubo de carro forte e caixas eletrônicos.

Longeani diz que o negócio é tão lucrativo que “há quadrilhas que estão se especializando em roubar armas em empresas de segurança, fóruns e até delegacias”. Mesmo assim, a polícia não se organiza para combater esses crimes.

“Até hoje o aluguel de armas não é investigado. Chega-se ao fato durante a apuração de outros crimes, como roubo, porte de arma ou formação de quadrilha”, explica o procurador.
Embora o delegado defenda o método atual porque “ao fazer a apreensão da arma já se faz o controle”, Longeani acredita que “a questão precisa receber um olhar especial” das Secretarias de Segurança Pública, que não reúnem dados estatísticos sobre a prática.

“A polícia tem um banco de dados com pelo menos 40% das armas em circulação. Elas deveriam ser rastreadas para encontrar o foco de desvio. Tem de parar de flagrar só na ponta e começar a trabalhar antes de o crime ocorrer. Já é possível identificar um padrão e atuar direto na fonte.”

Fonte: IG

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