Suicídios, infanticídios e o símbolo do macho: o rastro do crime em AL

De um lado, uma sociedade patriarcal, com hábitos de valentia, de valorização da honra e da palavra para a consolidação do "macho"; do outro, a sina de ser, no País, a sociedade com a maior quantidade de jovens assassinados, um crescimento que vem acelerando nos últimos dez anos.

A violência em Alagoas tem raízes mais profundas. Vão além da questão, tão atual, do uso das drogas, do tráfico, da execução sumária por causa da dívida de um punhado de pedras de crack.

"Há hábitos culturais nestas explicações. Quem tem uma arma, se sente importante, acredita ter mais poder. Há algo sobre isso no Nordeste que é maio que no Sudeste ou no Sul: existe a valentia, a honra, a palavra, hábitos sociais", disse a professora da Universidade Federal de Alagoas, Célia Nonata.

Ela coordena, na Ufal, o Grupo de Pesquisa História Social do Crime. Este grupo desenvolve uma historiografia criminal para Alagoas.

Os trabalhos estão no começo, mas apresentam algumas linhas quase conclusivas. O tratamento dado a casos de violência mostra isso.

Um policial de Arapiraca, por exemplo, disse a professor que não era hábito o registro de boletins de ocorrência para alguns casos de violência. Não por negligência ou a necessidade de esconder o caso:

"O policial ia para o lugar, resolvia a briga entre o marido e a mulher e ficava por isso mesmo", disse.

"Um dado que me chama a atenção: a quantidade de infanticídios e de suicídios é enorme. Não temos estatísticas ainda, mas são muitos. Imagine que o policial descobre que uma criança foi morta, vai à casa da mãe e registra tudo aquilo que ela diz: ‘a criança morreu porque caiu da cadeira’. Isso não existe, mas o policial registra isso no Boletim de Ocorrência. A mãe matou a criança, mas fica por isso mesmo. Vai se considerando normal", disse a professora.

"O que temos é uma cultura incentivando uma subcultura. Hábitos menos racionais vão tomando conta deste espaço. O jovem, assim, não é valorizado pela educação, pela inteligência, mas por ser valente, encrenqueiro. A educação, assim, não é um valor", disse.

Este valor se torna ainda mais caro pelo fato de Alagoas ocupar os índices sociais negativos em educação. As piores taxas estão no Estado.

"Incrível o acesso a armas de fogo em Alagoas. Sou de Belo Horizonte, nunca vi nada igual. O acesso às armas é uma questão governamental. O Estado faz vista grossa neste assunto. Existe displicência. E o jovem está em uma cultura patriarcal, onde existe a palavra e a honra para se resolver o assunto. Junte-se a isso também que o jovem tem a tendência natural de mostrar valentia, coragem e a arma pontecializa isso" disse Nonata.

Ainda com dados preliminares, Celia Nonata diz que em Alagoas a maior parte dos crimes é de natureza passional.
80% ainda destes crimes- passionais- está associado aos espancamentos. Há ainda o crime de mando, o crime político.

"O padrão dos homicídios até então identificados são todos de natureza instrumental e racional, revelando valores sociais importantes como a honra, a vingança e as formas de privação social. Como não estão diretamente interligados à violência privada, são considerados racionais? Ou seja, não estão associados ás categorias em ordem de ameaças, agressão, vias de fato, etc. Portanto, a partir disto percebe-se que o homicídio não traz a sua ligação à embriaguez pelo fato de serem os crimes encomendados e ou de execução. Foram escolhas racionais determinadas por fatores como a vingança, a honra masculina e a privação. Isto também nos chama a atenção para padrões de comportamento social a ser estudado na região", diz a professora, em trecho de palestra.

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