Dialética do cotidiano III

A espontaneidade no nosso convívio do dia-a-dia, por vezes nos parece sempre mal educada. No mesmo diapasão, ser sincero e verdadeiro também se torna tedioso ao convívio social. Tal convívio é pautado sob o manto da hipocrisia; ser hipócrita, neste caso, é ser bem articulado e desenvolto nas relações humanas.

De fato, existe uma linha que permeia toda uma farsa, numa espécie de salada de mentiras no meio social, que tem como objetivo abrandar e tornar mais alegre e descontraído o ambiente. Como num jogo de faz de conta, as pessoas vão realmente desempenhando seus personagens e procurando interpreta-los por força do convívio. De modo que, esta superficialidade funciona mesmo como um canalizador das relações; e é um instrumento fundamental de quem freqüenta as altas rodas e os caminhos do poder.

Por outra, se neste ambiente o indivíduo tirar sua máscara e mostrar-se desnudo e verdadeiro, pode se transformar numa pessoa tediosa e chata. Nas classes sociais mais baixas as pessoas são mais sinceras, daí, o tédio dos pobres; a sua indignação por dizer a verdade, e eles dizem uns aos outros, deixa certa monotonia na comunicação.

Por isso que em família e clube de gente proletária é muita briga e confusão. Já nas famílias e clubes dos abastados tudo é amais ameno, ou seja, os seres humanos são os mesmos, porém, com a arma da hipocrisia burguesa tudo fica bem resolvido.

É de certa forma uma distorção, mas, de um modo geral no Brasil, a vida pública, por exemplo, sempre foi um caminho fácil para um homem pobre tornar-se rico. Quase sempre nos começos de suas carreiras, esses cidadãos são políticos combativos e indignados com a situação econômica, política e social do país.

Todavia, depois de bem sucedidos em seus projetos políticos, tornam-se homens burgueses bem articulados, afáveis e hipocritamente corteses. É a metamorfose de Kafka viva e presente em todos nós. Agora me responda: o que não faz uma vida boa na vida de um boa vida? Olha, pensando bem, é melhor pensar em tomar um cafezinho…

E um cafezinho todo mundo procura sempre tomar para fugir da rotina e fazer uma digressão nas idéias. E quem fuma, vai tirando logo o cigarro e batendo na carteira três ou quatro vezes pra depois acender, ficando ali um momento em estado de meditação. O cafezinho a dois ou a três é um hábito hipócrita e superficial; de outra forma, sozinho, ele é bem verdadeiro e reflexivo.

Agora, comer um hambúrguer sem melar o nariz na maionese nem no tal do chetchup é impossível; ver uma linda mulher de brilho nos olhos circulando a nossa volta e não dirigir-lhes alguma gentileza é parada dura. De fato, essas espontaneidades em determinados momentos podem ser falta de educação, entretanto, não devem ser levadas em conta, afinal, essa tal de etiqueta é coisa pra francês e inglês.

Já para nós brasileiros, essas regrinhas sociais é um pouco saia justa demais. Portanto, relaxemos e brindemos à cerveja em taça de vinho, deseducadamente é obvio, porque por fim, é essa a nossa etiqueta, ou melhor, a nossa amada e organizada esculhambação.

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