Morre Telê Santana, uma vida de devoção ao bom futebol

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Telê deixa legado de taças e entrega ao futebol

Mineiro de Itabirito, falecido nesta sexta-feira, deixa legado de entrega por um esporte melhor. Seu histórico reúne momentos distintos, de xodó da torcida do Fluminense como jogador, à fatalidade em duas Copas pelo Brasil até a consagração no "super-São Paulo" dos anos 90. Leia mais sobre a carreira do treinador e a história do apelido "Fio de Esperança"

De "Fio de Esperança" a "pé-frio" até chegar a "mestre". Telê Santana, morto na manhã desta sexta-feira no hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte, aos 74 anos, carregou muitos rótulos durante a carreira vencedora como jogador e técnico. No entanto, o comandante brasileiro nas Copas de 1982 e 1986 e herói são-paulino na década de 90 deixa ao futebol um legado que transcende seus apelidos.

Telê tinha a saúde debilitaba desde o começo de 1996, quando sofreu uma isquemia cerebral durante exames de rotina. Desde então, passou maior parte de seu tempo em repouso ao lado de seus familiares. Em 2003, na mais grave decorrência de sua doença, teve parte da perna esquerda amputada após uma cirurgia de revascularização. O ex-treinador estava internado em Belo Horizonte com uma grave infecção abdominal desde o último dia 25 de março, quando passou mal em casa.

Tanto como atleta quanto treinador, Telê Santana se caracterizou por brigar por um futebol melhor, justo e bonito. A batalha por esportividade, beleza técnica e lealdade talvez tenha sido a maior contribuição desse mineiro da pequena Itabirito ao jogo que tanto se devotou.

Na época de jogador, orgulhava-se de respeitar a de ter ganhado o troféu Belfort Duarte, que era concedido no passado a atletas exemplos de disciplina. Como treinador, desenvolveu um perfecionismo que abrangia quase todos os detalhes técnicos do futebol, do cuidado com a grama do centro de treinamento à cobrança quase militar sobre seus comandados em ralação a fundamentos básicos, como o passe.

Mas não há como falar de Telê Santana sem mencionar seus inúmeros feitos esportivos. O mais importante deles como jogador aconteceu em 1952, com a conquista da Copa Rio, espécie de Mundial de Clubes da época, com a camisa do Fluminense.

Como jogador, Telê Santana não chegou a ser brilhante. Tanto que nunca foi convocado para a seleção. Era um ponta-direita de boa técnica, inteligência tática e muita movimentação e foi um dos primeiros atacantes a perceber a importância da marcação, recuando para fechar o meio-campo e impedir os avanços dos adversários. Jogava com muita vontade, correndo os 90 minutos de forma impressionante. Graças à essa vontade – e alguns títulos -, entrou para a galeria dos heróis tricolores.

No clube carioca, Telê era conhecido como "Fio de Esperança", por ser um jogador franzino (de 57 kg), mas que jamais desistia. Ainda como jogador, defendeu as camisas de Guarani, Madureira e Vasco.

Telê ganhou um lugar no time principal do Fluminense em 1951, ano em que o clube conquistou o título carioca. Na final, com Carlyle suspenso, o técnico Zezé Moreira deslocou o jogador mineiro para o comando de ataque, e ele não decepcionou, marcando os gols da vitória sobre o Bangu (2 a 0).

Ponto baixo: Copa de 1982

A "tragédia de Sarriá", com a derrota para a Itália e a conseqüente eliminação brasileira na Copa do Mundo de 1982, marcou o momento mais triste da carreira de Telê Santana como treinador.

Havia muita expectativa sobre geração virtuosa de Zico, Falcão, Sócrates (foto) e companhia, que encantou a Espanha na 1ª fase, mas sucumbiu nos pés do italiano Paolo Rossi no confronto de Barcelona, que decidia uma vaga na semifinal. Leia mais
Ainda como um jovem treinador, Telê entrou para a história do futebol nacional ao liderar o Atlético-MG ao título da primeira edição do Campeonato Brasileiro.

Por clubes, triunfou nos quatro centros mais importantes do país: no Rio de Janeiro com o Fluminense (1969), em Minas gerais com o Atlético Mineiro (1970 e 1988), no Rio Grande do Sul com o Grêmio (1977) e finalmente com o São Paulo no Paulistão (1991 e 1992).

Foi justamente com o São Paulo que o treinador viveu o apogeu de sua carreira, construindo e modelando a geração mais vencedora da história do clube. No começo dos anos 90, o time Telê varreu praticamente todos os títulos disponíveis, dominando o Estado, o país, o continente e o mundo.

Com um futebol vistoso, que cultuava o jogo coletivo e solidário, o São Paulo de Telê Santana despertou o interesse do brasileiro para a Copa Libertadores, vencendo o título sul-americano duas vezes seguidas, em 1992 e 1993.

Nos mesmos anos, o time de Telê superou duas potências européias, Barcelona e Milan, e suas respectivas posturas de empáfia em relação aos sul-americanos. Ao mesmo tempo, o São Paulo, com a conquista do bicampeonato mundial, alçou o futebol brasileiro de volta ao topo, numa época de escassez de taças e pessimismo pré-tetra.

Cerca de dez anos antes, o culto de Telê ao futebol bem jogado moldou uma das mais célebres seleções da história do Brasil. Em 1982, o super-time de Zico, Falcão e companhia encantou o mundo, mas caiu diante da Itália na Copa da Espanha. Do famoso fracasso do estádio Sarriá nasceria uma das mais polêmicas questões do futebol nacional: é mais importante jogar bonito ou ganhar?

Ponto alto: São Paulo

Telê Santana deixou a fama de "pé-frio" para trás com sua gestão no São Paulo, de 1990 a 1995. Ao todo, o técnico liderou a equipe na conquista de 11 competições.

Os mais importantes deles foram os bicampeonatos da Libertadores e do Mundial Interclubes. Telê também triunfou com o São Paulo no Brasileiro de 1991 e em duas edições do Paulistão.

No âmbito sul-americano, mais quatro taças: duas Recopas Sul-Americanas, uma Supercopa da Libertadores e uma Conmebol. De quebra, conquistas nos torneios internacionais Ramón de Carranza e Teresa Herrera de 1993 (goleando Barcelona e Real Madrid, respectivamente, por 4 a 1 e 4 a 0). Leia mais
Quatro anos depois, Telê voltou ao comando da seleção com muitas das peças da seleção de 1982. Com mais uma eliminação precoce, contra a França nas quartas-de-final, o Brasil viu nascer o fantasma da derrota nos pênaltis, que só seria exterminado na conquista do tetra.

Dois fracassos seguidos em Copas renderam a Telê a injusta pecha de "pé-frio". Foi só com o trabalho minucioso no São Paulo, cobrando seus atletas a cada passe ou cruzamento durante os treinos, que o treinador do "dia-a-dia" viu seu mérito reconhecido, deixando a fama de perdedor para passar a atender por "mestre".

Na incrível geração do Morumbi, a obstinação do treinador, que brigava até pela condição dos campos do Centro de Treinamento do São Paulo, "fez" jogadores como Cafu, modelou o talento de Raí e resgatou a capacidade de Müller. Só para citar alguns exemplos.

Por ironia do destino, numa espécie de compensação tardia a uma injustiça dos deuses do futebol, o time de Telê Santana deu à seleção tetracampeã mundial em 1994 cinco jogadores (Zetti, Cafu, Ronaldão, Raí e Müller).

No começo de 1996, uma isquemia cerebral afastou Telê do comando do São Paulo. A família do treinador alega erro médico, pois tudo aconteceu quando o mineiro realizava exames de rotina.

Telê foi submetido no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia a dois exames que, segundo especialistas, não eram a melhor opção inicial para o seu caso, e ambos com risco potencial de provocar um AVC isquêmico.

Depois do incidente, o São Paulo esperou o retorno do comandante por algum tempo, mas o treinador não conseguiu se recuperar. Assim, o então interino Muricy Ramalho acabou promovido. Meses depois, Telê Santana assinou com o Palmeiras para ser diretor-técnico, mas não chegou a assumir, em razão das mesmas dificuldades de saúde.

Desde então, Telê passou maior parte de seu tempo em repouso ao lado de seus familiares. Em 2003, na mais grave decorrência de sua doença, o já ex-treinador teve parte da perna esquerda amputada após uma cirurgia de revascularização.

Do sofá da sala de sua casa, Telê Santana assistiu à nova consagração do São Paulo na Libertadores e no Mundial de Clubes, em 2005. Na época, o ex-treinador fez questão de dizer que a equipe tricolor era tão boa quanto a sua dos anos 90, num gesto de desprendimento do passado glorioso e, claro, de esportividade.

Fonte: Uol

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