Carta aberta aos amigos

Amigos é a certeza de que a vida valeu a pena. É simples explicar o porquê. Enquanto aprendemos a ser o que somos, seguimos conquistando espaços a nossa volta, principalmente em outros corações. No entanto, um dia, o mundo vai nos mostrar face-a-face a nossa inutilidade diante dele. Quantos outros não poderiam exercer a nossa tarefa dentro do cotidiano, seja na profissão, ou em qualquer roda ou mesa de bar? Quantos não poderiam ter contado a mesma piada?

Todas as suas funções são substituíveis, menos no seu papel de amigo…

No entanto, a necessidade de estarmos juntos é um grito tão alto em meio ao silêncio do mundo, que apenas eu e meu amigo podemos ouvir. Uma das ferramentas mais fortes da civilização moderna é o medo de ser a si mesmo, diante do processo educacional, ou sócio-cultural. Na carta aberta ao meu amigo, ainda que muitas vezes imaginário, eu sou um eu necessário a um outro eu. Um eu que não se finaliza em si mesmo, nem se define, ou se compreende. Um eu que se traduz enquanto fala, mas que nunca chega a uma tradução precisa.

Lembro, ao falar de amizade, de uma frase de José Saramago – escritor português – que expõe: “a maior tragédia da vida é não sabermos o que fazer com ela”. Pois bem, quando Jean Paul Sartre coloca que “o inferno são os outros”, os amigos se fazem de oásis nestes infernos e nos direcionam, não em um sentido, pois não sei se há uma essência para alma humana, (acho vaidade extrema nos considerarmos superiores pelo ato do raciocínio e achar que Deus está mais preocupado conosco do que com as formigas…doa a quem doer esta citação, é o que acho) mas nos dá o conforto de que dentro da tragédia há uma beleza suprema e uma ligação entre seres humanos, que, por diversas vezes, nós mesmos julgamos impossível.

Não se trata de um pouco de otimismo para o pessimismo. Tanto os otimistas, quanto os pessimistas – ao meu ver – são pessoas que perderam o sentido e vagam no mundo por meio de expectativas. Detesto pessimistas, mas o que não suporto mesmo são os otimistas. A amizade é um laço, pelo menos em mim, que ameniza as pancadas da razão, para expor que ainda há no mundo experiências mágicas. É por conta dos amigos que consigo estabelecer a equação do italiano Antonio Gramsci: “É preciso unir o otimismo da vontade ao pessimismo da razão”.

Enquanto, como explica Esopo, “os tolos assumem para si o respeito que é dado ao cargo que ocupam", os que possuem amigos recebem um respeito que se arrisca a dizer ao outro o que pensa, mesmo na eminência de feri-lo, ou perdê-lo. Só agora entendo, uma das frases mais imbecis que ouvi de um grande amigo: “É impossível tirar a farpa do pé do Leão, sem fazê-lo gritar e em seguida correr atrás de você. Mas uma hora ele vai pisar no chão e perceber, o bem que a dor instantânea o fez”. A fraca – literariamente falando – metáfora do Leão simboliza a forma como muitas vezes agimos com nossas amizades. Quantas vezes não corri atrás de alguém querendo mordê-lo e hoje, ao pisar no chão, sei o que aquele momento significou.

Assim, ao estar com meus amigos, e perceber ao largo aqueles que –até com uma certa razão – não gostam de mim, descubro que só somos necessários mesmo aos nossos amigos e inimigos, no mais somos substituíveis, ou substituímos, ao bel prazer, o círculo de coisas indiferentes que nos envolvem. O problema é que às vezes damos valor demais as indiferenças.

Entre os meus amigos eu me torno eu, mesmo sem saber o que eu sou ao certo. E assim evito por alguns momentos estar no hall dos oradores, interlocutores e retóricos do cotidiano dito sério. Para andar entre a extrema sensibilidade, a simplicidade e porque não dizer das bobagens que fazem a vida valer a pena. Entre os amigos, abro os jornais dando razão ao sábio Leon Tolstoi: “quando as pessoas falam de forma muito elaborada e sofisticada, ou querem contar uma mentira, ou querem admirar a si mesmas. Ninguém deve acreditar em tais pessoas. A fala boa é sempre clara, inteligente e compreendida por todos”. É a fala de um amigo.

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