Santa Casa do Pará

O relatório que será apreciado e votado pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, traz um extenso cronograma de denúncias apresentadas por médicos e enfermeiros do hospital da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará nos últimos meses. São vários alertas de profissionais sobre o abandono e equívocos da gestão do hospital. De acordo com o deputado federal Zenaldo Coutinho (PSDB-PA), que como membro do CDDPH vistoriou as instalações e ouviu os depoimentos, a morte de mais de 200 bebês em um semestre já estavam anunciadas. ‘As mortes dos bebês na Santa Casa do Pará já vinham sendo anunciadas pelos médicos e enfermeiros desde o ano passado. O hospital vivia uma situação de completo abandono que redundou nessas mortes’, disse o deputado.

O primeiro pedido de socorro dos médicos do hospital, detalhado no relatório, foi em maio de 2006, quando denunciaram a superlotação e pediram providências urgentes. Um ano depois, os médicos pediatras enviaram uma carta à Coordenação de Neonatologia reivindicando a continuação de diálogo antes existente, a fim de alcançarem medidas de aprimoramento da assistência no hospital. Na mesma época, o Conselho Regional de Medicina (CRM) do Pará vistoriou o hospital e recomendou a aquisição de medicamentos e outros materiais; reforma e climatização das enfermarias; obrigatoriedade do uso de equipamento de proteção individual na lavanderia, e identificou superlotação no berçário; recém-nascidos entubados fora do ambiente da Unidade de Terapia Intensiva (UTI); falta de material como luva e sonda de aspiração e falta de medicação, além de paredes com infiltrações; limpeza mal feita, lixo hospitalar ao lado da geladeira e falta de antibióticos.

Em 6 de outubro de 2007, a imprensa noticiou a morte de 135 bebês no período de seis meses. Nesse mês, os pediatras denunciaram ao CRM a falta de equipamentos, como incubadoras, aparelhos para dosar glicemia, berços aquecidos, mantas, lençóis etc. Solicitaram também a intermediação do CRM para a abertura de negociações com a diretoria do hospital. No mês seguinte, o Sindicato dos Médicos do Pará denunciou o estado de precariedade do hospital. Já em dezembro, a Promotoria de Justiça inspecionou a Santa Casa e apontou a deterioração do hospital.

DESABASTECIMENTO

O histórico do relatório indica que em 11 de março deste ano, a equipe de pediatria da Santa Casa apresentou levantamento sobre as condições de trabalho na instituição, apontando a falta de algodão, álcool, gaze, detergente e papel-toalha e também de medicamentos como dobutamina, dipirona, paracetamol, antitérmico, analgésico, metildopa, anti-hipertensivo e vandomicina, bem como componentes da nutrição parenteral como poli-vitamínicos, oligoelementos, kits de laboratório para exame de uréia, creatinina, coagulograma e HIV, falta de máscaras de oxigênio e de inalação com medicação beta-adrenérgicas (as máscaras em uso eram reaproveitadas). Apontaram ainda a falta de monitores eletrônicos, oxímetros e material para ventilação. No mesmo mês, no dia 19, a Promotoria da Infância e Juventude de Belém ingressou com uma ação civil pública contra o Estado e a prefeitura, enumerando todos os problemas da Santa Casa. Pediram, ainda, a construção de um novo hospital materno-infantil. O Sindicato dos Médicos voltou a pedir providências ao Conselho Gestor da Santa Casa e denunciou a situação à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Secretaria de Estado de Saúde (Sespa), Ministério Público (MP) e Conselho Estadual de Saúde.

Em abril o problema chegou à Comissão de Saúde da Assembléia Legislativa, através de denúncias do Sindicato dos Médicos. Os ginecologistas anunciaram que iriam parar as atividades por causa das péssimas condições de trabalho na Santa Casa. Antes de estourar o caso, com a morte de dez bebês em uma semana, em junho, pediatras da Santa Casa enviaram ofícios com denúncias para OAB, MP e Sespa.

‘Ficou claro que os problemas foram denunciados diversas vezes. Todo mundo sabia que as enfermarias ofereciam grande risco de infecção hospitalar, os aparelhos de ar-condicionado funcionavam precariamente, as tomadas de energia elétrica não funcionavam, as lâmpadas queimadas não eram trocadas, havia portas quebradas, saídas de oxigênio que não correspondiam ao número de leitos, falta de roupas para as pacientes, materiais de limpeza e inúmeros medicamentos. Essas mortes foram, inúmeras vezes, anunciadas’, afirmou Zenaldo.

RECURSOS

Pelo relatório, entre as principais causas das mortes de bebês na Santa Casa, está a redução de recursos conveniados do Estado com os municípios, para contratação de médicos 24 horas em todas as cidades paraenses. Em 2006, foram repassados R$ 40 milhões e, em 2007, somente R$ 10 milhões. Condenam ainda a administração do doutor Anselmo Bentes, desde a falta de diálogo até a não-aquisição de medicamentos e equipamentos; o desmonte do Conselho Gestor e da Ouvidoria da Santa Casa; e a suspensão do uso do protocolo de rotina hospitalar.

Também apontam a substituição de servidores temporários, com larga experiência em UTI Neonatal, por concursados sem treinamento adequado para a transição, como um fator para o caos do hospital. O relatório será analisado e votado pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana na próxima reunião, marcada para o dia 12 de agosto. Depois de aprovado, será encaminhado à Presidência da República, Ministério da Justiça, Ministério Público Federal e autoridades do Pará. Outras medidas poderão ser tomadas durante a reunião.

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