Renan recomenda reforma capaz de racionalizar gasto público

Renan faz avaliação positiva da atual legislatura do Senado
Renan faz avaliação positiva da atual legislatura do Senado

Uma reforma orçamentária capaz de racionalizar o gasto público, a fim de superar o gargalo tributário que dificulta o crescimento econômico do País. A recomendação foi feita pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, numa entrevista para a Agência Senado em que respondeu às mesmas perguntas feitas ao senador José Sarney (PMDB-AP) sobre a legislatura que se encerra. Definindo o Estado brasileiro como pesado e burocrático, Renan disse que a burocracia excessiva é aliada fiel do desperdício e acaba impedindo o fluxo de recursos para setores prioritários, como os investimentos em infra-estrutura.

Agência Senado – Que avaliação o senhor. faz da legislatura que se encerra?

Renan Calheiros – Bastante positiva. Mesmo diante das dificuldades políticas sem precedentes que o País enfrentou, mesmo diante de uma campanha eleitoral acirrada, o Senado agiu com muita firmeza e equilíbrio. Não tenho dúvida de que essa atuação foi fundamental para a estabilidade das instituições e para a governabilidade. Nós, senadores, exercemos plenamente a competência investigativa, para corrigir e prevenir desvios de conduta na administração pública, sem que isso, absolutamente, interferisse no processo legislativo. Não ficamos, em nenhum momento, reféns ou imobilizados pelos acontecimentos adversos da vida política. Foram mais de duas mil e seiscentas matérias aprovadas em 2005 e 2006 – cerca de mil apenas neste ano. A propósito, na legislatura passada, pela primeira vez, desde a edição da Constituição de 1988, tivemos mais matérias promulgadas de origem parlamentar. Qualitativamente, o Senado aprovou matérias de grande impacto positivo para o País, principalmente as relacionadas aos marcos regulatórios, à desoneração tributária de setores estratégicos da economia, ao financiamento da educação, ao aperfeiçoamento do sistema orçamentário, dentre outras. Tenho dito que o recém-lançado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não teria encontrado solo fértil se não fosse a aprovação, pelo Senado e pelo Congresso, de várias matérias que permitiram melhorar o ambiente econômico e institucional do País.

AS – Em sua opinião, quais foram as matérias mais relevantes aprovadas pelo Legislativo para fazer o Brasil voltar a crescer?

RC – Cada lei que é produzida vem atender uma necessidade da sociedade, razão pela qual todas têm um grau de relevância. É importante ressaltar que, logo no início do ano passado, aprovamos a Emenda Constitucional 50, que diminuiu o recesso parlamentar de 90 para 55 dias e vetou o pagamento de qualquer parcela indenizatória em razão de convocação extraordinária. Logo em seguida, aprovamos a Emenda Constitucional 51 que permitiu a contratação dos agentes de saúde, que somam cerca de trezentos mil em todo o País e que desempenham papel fundamental no combate a doenças e endemias. Considero relevantes a aprovação do Marco Legal do Saneamento, que irá permitir maiores investimentos no setor; a MP do Bem, que criou incentivos para o desenvolvimento de setores importantes e geradores de emprego; o Estatuto da Microempresa, que dará maior dinamismo a pequenos e médios empreendimentos; o Fundeb, que ampliará o volume de recursos para a educação básica; a reforma infraconstitucional do Judiciário, que favorece uma justiça mais rápida; o fim do monopólio dos resseguros, que permitirá o barateamento dos seguros, inclusive para os agricultores; a compensação de quase dois bilhões de reais para estados e municípios exportadores (Lei Kandir); a atualização da tabela do Imposto de Renda da pessoa física, que representa uma medida de justiça tributária; a chamada Lei de Incentivo ao Esporte; e a criação do Fundo Setorial Audiovisual, indispensável ao crescimento da indústria do cinema. São exemplos do talento e da capacidade legislativa dos senadores na construção de normas sintonizadas com os novos desafios do Brasil. Aprovamos no Senado projetos que promoverão um grande salto qualitativo no funcionamento das instituições. A reforma do processo orçamentário no Congresso já foi aprovada na Casa, o que dará maior consistência às leis de orçamento votadas. Precisamos avançar para um orçamento mais realista e impositivo, que é uma das bandeiras mais antigas do senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). Também aprovamos aqui e enviamos à Câmara todas as alterações necessárias para que a tramitação das medidas provisórias se compatibilize com os interesses legislativos do Congresso. Espero sinceramente que esse tema avance rapidamente na Câmara.

AS – Por que o Brasil não cresceu nos índices esperados?

RC – Em que pesem os avanços institucionais do País, o Estado brasileiro ainda é pesado e burocrático. A burocracia excessiva, por sua vez, é uma aliada fiel do desperdício, que acaba impedindo o fluxo de recursos para setores prioritários, como os investimentos em infra-estrutura. Isso, sem dúvida, há que ser rapidamente modificado e o caminho passa, necessariamente, pela revitalização do planejamento e orçamento públicos. É por isso que tenho batido sempre na tecla da reforma orçamentária, para que cheguemos a uma racionalização do gasto público. A racionalidade do gasto público é indispensável na superação do gargalo tributário. Nossa carga tributária, que beira a casa dos quarenta por cento do PIB atual, é verdadeiramente um inibidor da produção. O Senado há muito já aprovou uma reforma tributária, com começo, meio e fim, que prevê o fim da cumulatividade dos impostos e a implantação de um sistema de tributação mais justo. E não podemos tratar o assunto apenas sob a ótica dos impostos dos estados e municípios, cuja capacidade financeira já está esgotada. Sobre isso, gostaria de ressaltar que o Senado, conforme determina a Constituição, irá exercer plenamente mais uma importante competência, que é justamente a de avaliar o sistema tributário nacional, inclusive sob a ótica do volume da carga tributária e da repartição das receitas entre a União e demais entes federados. A segurança jurídica dos contratos ainda é um ponto sensível na credibilidade institucional do Brasil, que acaba afugentando os investimentos privados. Apresentei uma proposta de emenda à Constituição que veda a edição de medidas provisórias em matérias contratuais, que, se aprovada, certamente, estimulará maiores investimentos em infra-estrutura nas Parcerias Público-Privadas, com impactos positivos no crescimento da economia e no emprego. Os atuais juros elevados também são uma mazela, porque impedem a realização de novos investimentos. É preciso ter em mente que a melhoria nas avaliações internacionais do risco Brasil já sinaliza que é chegada a hora de reduzirmos as taxas de juros para níveis compatíveis com as nossas necessidades de crescimento. O Senado já aprovou todas as reformas necessárias ao crescimento da economia. Já fizemos a nossa parte. Estamos prontos e preparados para os outros desafios que se apresentarão.

AS – Por que o governo reclama mais agilidade do Legislativo?

RC -No Senado temos votado rapidamente todas as matérias de interesse da sociedade. Os números já citados e a qualidade da nossa produção legislativa são uma demonstração cristalina de esforço e celeridade. No entanto, é digno de registro o fato de que tivemos quase setenta por cento das sessões da Casa trancadas por medidas provisórias. Por isso mesmo, o Senado já aprovou, em fevereiro do ano passado, tendo remetido à Câmara, todas as alterações necessárias para que o processo legislativo não seja retardado por MPs. Mudanças como essas irão conferir maior agilidade ao processo legislativo, razão pela qual é fundamental que o assunto seja aprovado na Câmara já no início da nova legislatura.

AS – Que cenário o senhor desenha para a próxima legislatura?

RC – A próxima legislatura será pautada pelo fortalecimento do Senado, do Poder Legislativo e da democracia, e pela continuidade do diálogo com os partidos e instituições. Basta examinar o relativo equilíbrio das forças partidárias na nova composição da Casa. Isso indica que todas as deliberações da Casa serão ainda mais realizadas com base no entendimento e na negociação política. As matérias aprovadas, não tenho dúvidas, ganharão cada vez mais as cores dos partidos e dos seus representantes no Senado, o que é absolutamente saudável para o processo democrático e para a nossa imagem institucional. Estaremos mais inseridos nas grandes decisões nacionais. Além de avaliar o sistema tributário nacional, o Senado irá examinar todas as propostas de Parcerias Público-Privadas enviadas pelos entes federados, conforme determina a legislação em vigor. A bem da estabilidade normativa, iremos deliberar sobre os vetos presidenciais, pondo um fim na incerteza sobre a validade futura de dispositivos não sancionados pelo presidente da República. Além disso, deveremos ratificar as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a inconstitucionalidade de várias leis, para que essas decisões tenham efeitos concretos no mundo jurídico. Como resultado dos trabalhos da Comissão criada no ano passado no Senado, deveremos formatar um Regimento mais claro, que certamente facilitará o trabalho dos senadores e das Comissões. Quanto ao diálogo institucional, tenho ouvido de vários interlocutores que o Senado vem se consolidando como uma Casa cada vez mais aberta às instituições da sociedade organizada e isso, no que depender de mim, prosseguirá.Concretamente, vários projetos que tramitam hoje aqui nasceram desses segmentos organizados e nos poderes constituídos, tornando as leis mais próximas das reais necessidades do País. A PEC dos precatórios, a minirreforma eleitoral e a reforma infraconstitucional do Judiciário vieram da magistratura. A PEC que vincula provisoriamente recursos para a segurança pública é resultado do permanente diálogo que mantemos com o colégio de secretários de segurança dos estados. O projeto de lei complementar que informa ao cidadão o valor dos tributos nos produtos e serviços nasceu justamente nos grupos sociais de defesa do consumidor e na classe empresarial, apenas para citar alguns casos. Sobre a segurança pública, além do conjunto de medidas já aprovado no Senado, continuaremos a avançar numa legislação que combata efetivamente as raízes da criminalidade, num diálogo permanente com os estados. A segurança pública é uma condição necessária para melhorar o ambiente de investimentos. Na sua ausência, não há garantia de estabilidade das relações sociais ou econômicas. Como se vê, o cenário é de grande trabalho para os senadores.

AS – O Programa de Aceleração do Crescimento vai ser facilmente aprovado no Congresso?

RC -O PAC envolve matérias de grande complexidade técnica e política, já que algumas delas interferem diretamente em interesses fundamentais dos entes federados, como no caso das renúncias fiscais que gerarão incentivos produtivos. Logo, a apreciação do programa requer um amplo debate no Legislativo, em favor do aperfeiçoamento das proposições, o que é saudável e absolutamente compatível com a nossa opção democrática. O Senado, por excelência, será o fórum qualificado para a formação de uma convergência política, naquilo que for essencial para o crescimento de nossa economia, principalmente no que diz respeito ao pacto federativo. Não poderemos tratar esses assuntos de maneira açodada e nem suprimir o debate democrático. E o governo sabe disso, pela postura que o Senado e os senadores têm adotado. De qualquer forma, além do aperfeiçoamento e da aprovação das medidas para o crescimento, no âmbito legislativo, é imprescindível que elas, no plano executivo, alcancem verdadeiramente os agentes econômicos e a população de uma maneira geral, o que requer gerenciamento e racionalidade na sua execução. Tanto o governo sabe disso, que o presidente da República afirmou no seu discurso de lançamento do PAC que "aqui não se cresce sacrificando a democracia".

AS – O PAC vai realmente propiciar esse tão esperado crescimento econômico?

RC – As medidas são muito positivas, numa primeira análise, porque pretendem criar condições favoráveis ao investimento produtivo. Além disso, geram boas expectativas quanto ao futuro da economia, mobilizando pessoas e fatores para o crescimento. O Senado e o Congresso irão, obviamente, aperfeiçoar o Programa, a partir das demandas vindas da sociedade organizada. De qualquer forma, como o crescimento econômico é um processo contínuo, o PAC não esgota o universo de medidas ou reformas institucionais necessárias a uma trajetória estável de crescimento, com justiça social, tarefa que deve ser complementada por outras ações, de natureza não apenas legislativa. No que depender do Senado, e a experiência tem mostrado, não só o PAC, mas todas as matérias de impacto positivo no crescimento merecerão nossa especial atenção. Lembro, inclusive que, no início de 2005, levamos ao presidente da República um conjunto de propostas no âmbito de uma Agenda do Crescimento, envolvendo ações no campo institucional, econômico e social. Ressaltaria que o avanço econômico depende também do avanço da reforma política, que já aprovamos no Senado, em prol do fortalecimento dos partidos e da realização de acordos suprapartidários em torno de conteúdos programáticos. Isso trará maior previsibilidade para as políticas públicas, reduzindo as incertezas econômicas.

Agência Senado

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