Eu não consigo odiar ninguém…

“Não consigo odiar ninguém” é o nome da nova canção de Humberto Gessinger. Dei de cara com ela há pelo menos um mês. Tenho escutado sem parar, pois me fez pensar muito no meu momento atual. A canção abre de forma maravilhosa e quase exemplificando a forma com a qual eu tento envelhecer: “Não quero seduzir teu coração turista/ Nem quero te vender meu ponto de vista”. Tenho achado que é por ai. Envelhecer tentando chegar ao “politicamente correto” – o que é quase impossível – e sem ter que provar nada a ninguém. Rasgando os mapas quando for necessário. Perdendo a fé na bússola quando surgir a necessidade de novos horizontes.

Fazia tempo que uma canção não me emocionava tanto e nada tem a ver com beleza de letra ou melodia, mas a palavra na hora certa. Passei um tempo andando sem sonhar, ou como diria a minha amada esposa: vivendo no piloto automático. Eu precisava acordar para sonhar. Estou tentando fazer isto ao chegar aos 30 anos. Recuperar utopias. Correr atrás de uma inocência qualquer, que ainda me permita enxergar oásis em meio a este deserto, onde a vida é superficialmente resumida às últimas do esporte, a hora certa, crime, economia, política e religião.

Escrevo hoje em dia para exorcizar. Não quero convencer, nem argumentar coisa alguma. Os corações andam tão turistas ultimamente e por paraísos tão questionáveis, que eu tenho evitado contatos imediatos de primeiro grau. Prefiro as longas conversas em silêncio com os poucos amigos que tenho. Ou os pequenos sentimentos gigantescos que cabem nos intervalos de lucidez, diante do corre-corre da vida pós-moderna. Não me atrai sair de casa para o “show da moda”, nem para a lanchonete point ao lado de casa. A solidão me atrai mais, felizmente ou infelizmente…não sei…

Sou do tipo que acha que o cérebro é nosso melhor órgão sexual. Que sedução é convencimento em uma linguagem mista de idéias e gestos. Que adora sentar no sofá para vê TV com quem se ama, como se fosse um diálogo com palavras. Do tipo que não entende o porque das luzes da boate e que nunca soube trocar difíceis palavras de amor conquistadas e talhadas com o tempo, pelo fácil panorama dos espelhos de motéis. E nunca quis convencer ninguém de que isto é um estilo, ou a melhor forma, até porque não sei se estou certo, nem sou assim porque quero…é condição de sentir o mundo de outro jeito…de vibrar em outra freqüência, talvez…

Vira e volta encontro quem me entenda. Poucos, mas bons amigos. Artigos de luxo. Que também não vendem opiniões, nem dogmatizam suas formas de ver a vida. O dogma leva a um ódio FDP. A vida da gente passa a parecer uma página de Orkut: “eu odeio isso” e “odeio aquilo” e “odeio a cor da camisa que o fulano de tal estava no programa tal, no dia tal, na hora de tal…”. É muito ódio gratuito disseminado em meio a certezas falidas. Ficar em casa e saborear o pouco que vida me deu, me basta. Faz-me ter a certeza de ser feliz.

Um conhecido que vive 24 horas de terno disse: “faz tempo que não sei o que é por o pé na areia da praia”. Eu fiquei abismado. Faz tempo que eu não faço coisas bobas e felizes também. Eu preciso por o pé na areia da praia. Eu preciso, eu preciso…eu preciso de lirismo para viver.

O velho Gessinger, em um trecho de sua nova canção coloca: “Não vá dizer que eu estou ficando louco/ Só porque não consigo odiar ninguém/ Do goleiro ao centroavante/ do juiz ao presidente/ eu não consigo odiar ninguém”. Acho que isto que ando buscando no final das contas. Importar-me muito mais em “amar e mudar as coisas (Belchior) do que necessariamente passar a odiar e perder o tempo em que eu poderia estar sendo melhor. Melhor que eu mesmo e não que ninguém.

Caminhando pelo comércio de Maceió por estes dias e cheio de contas a pagar, percebi – do nada – que odiar alguém ou alguma coisa é um suicídio interno. É como caminhar carregando fantasmas. É inútil para quem precisa viver e aproveitar intensamente suas conquistas. Afinal, quando o tempo pára em alguma questão, tudo amarela feito fotografia. É preciso seguir em frente…

Foi aí que fiz um paralelo entre a canção e um texto que li – de autoria de Vanessa Alencar (publicado aqui no Alagoas 24 Horas) – sobre a chegada dos 30 anos de idade. Ela fala de forma específica sobre as mulheres em si, mas deixa uma grande lição no final, que é a do recomeço diante do já vivido. Eu já vi o fim do mundo por várias vezes e – quando eu menos esperei – o mundo renasceu de novo. Hoje em dia, a única coisa que não quero perder de forma alguma é a capacidade de sonhar. “Pode até ser o fim/ Mas será que é inevitável”.

Quando mais envelheço, mais radical tenho ficado para algumas coisas. Tenho aberto a mão de muitos prazeres. Tenho deixado que muitos se aproveitem de minhas idéias e meu tempo, até mesmo para ficarem ricos (financeiramente falando mesmo). Porém, meu espírito não vão conseguir ferroar ou quebrar. Já iniciei e fechei tantos ciclos, que agora sei – de todos eles, até mesmo dos piores – sempre fiquei com o melhor de todas as metamorfoses em mim.

Um exemplo disto: duas das pessoas que mais amo na vida (minha mulher e minha filha) só se tornaram realidades em minha existência porque fui destinado a sofrer com ela (minha esposa) e por elas num dos ambientes de trabalho que durante muito tempo odiei em minha vida. Graças a Deus que fomos demitidos. Foi muito bom. Hoje estou em outra (como dizem por aí). Tenho tentado lavar este ódio de dentro de mim, é difícil…mas pretendo um dia sair cantando por aí: “Não consigo odiar ninguém”.

Para quem ainda não conhece, vos apresento da música, pelo menos a letra:

não quero seduzir teu coração turista
não quero te vender o meu ponto de vista
eu tive um sonho e há muito não sonhava
lembranças do futuro que a gente imaginava
nem sempre foi assim, outro mundo é possível
pode até ser o fim mas será que é inevitável

não vá dizer que eu estou ficando louco
só por que não consigo odiar ninguém
do goleiro ao centroavante
do juiz ao presidente
eu não consigo odiar ninguém

o tempo parou feito fotografia
amarelou tudo que não se movia
o tempo passou, claro que passaria
como passam as vontades que voltam no outro dia

não vá dizer que eu estou ficando louco
só por que não consigo odiar ninguém
do goleiro ao centroavante
do juiz ao presidente
eu não consigo odiar ninguém

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