‘Ele colocou a arma na minha cara’, diz PM preso por delegado

Advogado diz que prisão foi ilegal; delegado diz que ainda irá se pronunciar.

ReproduçãoPMs do Acre invadem Delegacia de Flagrantes

PMs do Acre invadem Delegacia de Flagrantes

O sargento da PM Wendel da Silva, que se envolveu em uma confusão no sábado (1º) após receber voz de prisão do delegado Leonardo Santa Bárbara, em Rio Branco, afirmou nesta segunda (3) que teve uma arma apontada para o rosto dentro da Delegacia de Flagrantes (Defla).

O sargento recebeu voz de prisão e foi acusado de desobediência e falso testemunho depois de se negar a aplicar o teste de bafômetro em um motociclista autuado durante um acidente de trânsito que se recusou a passar pelo procedimento ao ser abordado.

Após ser levado à delegacia, ao menos 50 homens da PM e do Batalhão de Operações Especiais (Bope) fortemente armados invadiram o local para resgatar o policial preso, causando tumulto.

O delegado Leonardo Santa Bárbara negou que tenha apontado a arma para o sargento e garante que agiu conforme a lei.

"Dei voz de prisão e, em seguida, ele pegou a arma. Eu me levantei e também saquei minha arma e pedi para que ele permanecesse como estava. Depois disso informei para os superiores dele o que estava acontecendo. Diante da negativa de acompanhamento pela PM, fiquei sabendo que os policiais foram convocados a resgatar este agente que nem estava algemado", diz.

Santa Bárbara afirma que a invasão na delegacia ocorreu após ordem do tenente-coronel Márcio Alves. "Policias civis tentaram evitar o conflito, porém, foram agredidos. Tem caso de policiais militares que ficaram chutando os civis. Um ato covarde", afirma.

Trabalhando no trânsito há dez anos, Wendel, de 32 anos, disse que sempre teve um bom comportamento como policial e que, mesmo durante o atrito com o delegado, manteve a calma. Segundo o sargento, Leonardo Santa Bárbara ficou extremamente exaltado após sua recusa em fazer o teste de bafômetro no motociclista.

“Ele começou a gritar, alterado, dizendo: ‘Eu mandei você fazer o bafômetro, se você não fizer eu vou mandar lhe prender por desobediência’”, relatou Wendel. O sargento disse que, segundo o regimento da PM, a situação deve ser acompanhada por um superior. Por isso, afirmou, após o delegado avisar que pretendia autuá-lo por desobedecer a uma ordem, decidiu ligar para o tenente-coronel da PM Márcio Alves.

“Eu voltei para a sala e disse que estava chegando um superior meu. Depois de um tempo, o tenente chegou, expliquei a situação para ele e voltei para ser ouvido pelo delegado. O Leonardo deixou um policial civil na sala e pedi que o tenente ficasse comigo lá. Ele negou e disse que era o dono da delegacia e todos os policiais militares eram subordinados a ele. Eu, como condutor, aplicando a lei, fui tratado como o inverso, como se estivesse fazendo algo errado. Simplesmente fui levar à delegacia o condutor que cometeu um crime”, contou.

Segundo o PM, após o superior ter a entrada impedida, houve uma tentativa de gravar a conversa pelo celular. Porém, o delegado também proibiu a ação, afirmou.

Depois, já com a situação mais calma, ele disse ter sido ouvido pelo delegado, que imprimiu a ocorrência sobre a negação do pedido de realizar o bafômetro e a entregou para que assinasse. Orientado pelo tenente a não assinar a parte do documento em que falava de sua negação, o PM disse ter recebido uma nova acusação, desta vez por falso testemunho.

“Ele perguntou se eu não iria assinar, eu disse que assinaria até certo ponto. Nesse momento, o delegado bateu na mesa, levantou e disse: ‘Sargento, você está preso por falso testemunho’. Colocou a arma na minha cara, foi arrodeando a mesa e abriu a porta com a arma em punho, chamando os outros policiais”, disse.

Wendel contou que, quando o delegado disse que ia levá-lo para a cela, contestou, alegando que como policial não podia dividir a cela com outras pessoas, incluindo o suspeito que tinha levado para a delegacia.

Para Wendel, não houve invasão ou resgate, e sim uma "ação arbitrária". Segundo ele, alguns delegados chamados por Leonardo Santa Bárbarba quiseram forçá-lo a cumprir a ondem do delegado, o que acabou gerando uma confusão na delegacia.

“Me agrediram e me puxaram. Foi nesse momento que a PM sentiu que devia me retirar daquele local, dado que os delegados estavam extremamente exaltados. Teve um delegado que fez até menção de pegar a pistola. Acharam por bem me colocar em uma viatura até que a história se desenrolasse, mas não houve resgate. A PM agiu na conformidade da lei, dentro dos princípios legais do direito”, pontuou.

Com toda a documentação do ocorrido em mãos, o PM pretende levar o caso ao Ministério Público para que seja investigado o abuso de autoridade cometido pelo delegado.

Advogado
O advogado da associação dos PMs, Wellington da Silva, afirma que foram várias as ilegalidades cometidas pelo delegado durante o ocorrido. Para ele, o trabalho do sargento terminou no momento em que Wendel entregou o relatório do acidente e a delegacia o recebeu. “A única função dele ali devia ser ouvido para dar informações sobre a ocorrência e depois ser liberado para voltar para a rua. O delegado exigiu que o PM fizesse um procedimento ilegal, que seria oportunizar novamente para que o cidadão fizesse o bafômetro. Só que no momento em que o cidadão se nega a fazer esse exame ele já é autuado, deve ser autuado e foi o que ocorreu."

Para Wellington, se Wendel tivesse acatado a ordem, também podia ter cometido um crime, pois já haviam se passado mais de três horas após o acidente e os vestígios de álcool no sangue podiam ser insuficientes no bafômetro, contradizendo o primeiro relatório assinado pelo PM.

O advogado também explica que o delegado se equivocou em tachar Wendel de "foragido", já que em nenhum momento o policial foi julgado. “Ele não é foragido, porque não existe nenhuma ordem judicial de prisão. Então ele não está na condição de foragido. Ele está livre, como diz a Constituição, resguardado no seu direito de ir e vir”, disse.

Posição da associação
Isaque Ximenes, presidente da Associação de Policiais Militares do Acre, diz que os casos de desentendimento entre as polícias têm acontecido com mais frequência, principalmente pela forma como os delegados tratam os policiais militares.

“Os policiais reclamam que quando chegam lá na Defla e apresentam o indivíduo em flagrante são tratados de forma muito ríspida. Isso vem ocorrendo sempre. Já está virando uma rotina."

Apesar da repercussão do caso, Ximenes diz que não existe uma "crise". “Eu não diria que existe uma crise entre as polícias Civil e Militar. Diria que existe uma relação de desentendimento com um grupo pequeno, não com toda a Polícia Civil”, avalia.

Fonte: G1

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