Lei Seca

"Eu fiz um voto para você parar de beber". Eu não entendi a frase da minha mãe. Não sei se pelo fato de a sacola de cervejas estar pesando nas mãos ou porque não sou muito chegado a votos. Mas vi que ela falava sério. E também que meu candidato estava prestes a perder as eleições.

Não entendi o motivo da promessa – ou do voto, como ela fez questão de enfatizar. Não sou de beber muito, apesar de ela querer insinuar que eu estava que nem caminhão de usina: me acabando na cana. Uma cerveja ou outra nos finais de semana é todo o meu teor alcóolico. Se for comparar à eleição, bebo igual ao tempo que o Enéas tinha no Guia Eleitoral. O suficiente para o ex-barbudo dizer "meu nome é Enéas".

Dá nem prum gole. Mas às vezes as mães exageram. "A senhora faz o voto e quem tem de fazer boca de urna sou eu?", questionei. Como já tinha comprado as cervejas, apelei: "Deixe eu ir pelo menos pro segundo turno". Ela fez que sim com a cabeça. E comecei a abrir tudo que é garrafa. Se é para levar o voto a sério, que ele tenha o ritmo de uma urna eletrônica: ligeirinho que nem coceira de macaco. E comecei a me deliciar com a Heineken como quem vai passar pela maior lei seca da vida.

A cada verdinha jogada no lixo, olhava pra minha mãe ao longe. "Seu candidato tá levando de lambujem", pensei. "Vou apelar pro Superior", ela disse, parecendo adivinhar meus pensamentos. "O Tribunal Superior Eleitoral?", quis saber. "Não, o Divino". Como temo a fé da minha mãe comecei, a partir daquele momento, a jogar uma pro santo. Qualquer uma não, senhor. Importada, para atrair santo dos States.

Ao final, a contar pelo volume de cerveja espalhado pelo chão, os santos deveriam estar mais embriagado do que eu. E antes de tomar a última – retirada do congelador como quem cumpre um ritual – ainda apelei: "A senhora, por acaso, não teria votado nulo não?"

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